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domingo, julho 08, 2007

Maria de Buenos Aires

“Ali estava eu, de pé, no meio do grande átrio daquela grande escola com uma grande história. Olhei para todos aqueles rapazes e raparigas, todas aquelas fotografias, todas aquelas pessoas ausentes, quase completamente desaparecidas. Lembro-me que Franca me provocou uma impressão muito estranha. Depois de ler um poema que ela tinha escrito olhei para a sua fotografia: o seu sorriso caloroso revelava uma simpatia que eu não conseguia descrever.

Quando soube quem ela era não senti revolta ou tristeza, como imaginaria. O que senti foi terror, um terror incompreensível de alguma coisa que não consigo especificar. E quis ir-me embora, e assim o fiz. Mas a sensação inconsciente de impotência pouco a pouco deu lugar à consciência de que não havia lugar nenhum para onde fugir. Pensei que a sensação de terror vinha desses tempos e do que aconteceu então. Talvez fosse o medo de que me pudesse acontecer a mim, a sensação egoísta de insegurança. No entanto, comecei a compreender que era o próprio poder que eu temia acima de todas as coisas. Era o medo do que a sua impunidade podia provocar em mim, medo do que eu próprio pudesse fazer.
No presente, quando a ditadura e a morte estão supostamente distantes, por alguma razão o terror persiste”
Bernie, estudante do 3º ano no Colégio Nacional de Buenos Aires, sobre o ensaio fotográfico “Buena Memória”, de Marcelo Brodsky, que lembra os milhares de desaparecidos durante os anos da ditadura militar na Argentina, quando militantes e simples simpatizantes de esquerda eram sistematicamente raptados por paramilitares encapuzados.


A oratória “Maria de Buenos Aires”, com música de Astor Piazzola recordou a história desse periodo negro, milhares de histórias, repartidas entre putas e santas, pelas muitas Marias que ficam, independentes dos dramas das macro-politicas proto- fascistas, condenadas a dançar o tango, (ou o fado) da vida.
Foi curioso, no mínimo, ver a Mísia, uma manifesta apoiante do Bloco de Esquerda, interpretar a peça no esplendor do São Carlos. Terminou assim a época de Paolo Pinamonte e a ousadia na gestão da programação do Teatro de Ópera Nacional. O cinzentismo regressa já na próxima época, vincado desde já pela anunciada e banida 3ª parte da trilogia do Anel de Wagner e pelo espectro que paira sobre o Teatro, de que se diz à boca pequena, será colocado sob a alçada da EGEAC, o departamento kultural que trata dos mangericos da Câmara de Lisboa.

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