Pesquisar neste blogue

segunda-feira, abril 09, 2012

As ficções financeiras que nos andam a tramar a vida real

"O meu optimismo baseia-se na certeza de que esta civilização está para se desmoronar. E o meu pessimismo está em tudo o que está a ser feito para nos arrastarem na sua queda" (Guy Debord)

a Visão/História publica um caderno sob o titulo genérico “as Crises do Capitalismo” onde procura ensinar, deturpadamente, “ o que podemos aprender com o que se passou nos últimos… nós diriamos, 100 anos. Num contexto geral – qual das crises foi mais dolorosa, 1929, 2008 ou a actual (como se não fossem a mesma) – procura-se atribuir as culpas no cartório ao acto, um caso de policia, responsável pela titularização em Bolsa de valores inexistentes. É verdade, mas não é, nem de perto nem de longe, a verdade toda. É o sistema capitalista em si que é um acto criminoso, passível de actuação da policia (uma policia diferente, mandatada pelo Povo)


Num gráfico que aqui se reproduz em duas partes mostra-se a evolução do índice dos valores em dinheiro criados em Bolsa (acumulação de capital com juros e lucros sobre capital). Entre 1900 e 1950 a massa monetária mundial em circulação duplicou – o que até pode ser percebido pela duplicação dos bens criados pelo capitalismo numa fase ascendente ao serviço da evolução humana – num sistema sempre comandado pelo juro cobrado à cabeça em favor de instituições privadas pela Reserva Federal desde 1913. Seis décadas depois um acontecimento fulcral (já descrito aqui) vem mudar radicalmente o paradigma económico financeiro global - Em 1971 o governo de De Gaulle anunciou a troca dos créditos franceses em dólares por Ouro, apresentando-os à cobrança perante o Tesouro dos Estados Unidos, segundo o padrão vigente desde Bretton Woods.

Outros países pretenderam seguir o seu exemplo: já previam o aumento dos preços do petróleo levado a cabo pela organização dos países produtores que acabaria por chegar na forma do boicote petrolífero à Europa e aos Estados Unidos em 1973. Foi nesta perspectiva que, num dia de Agosto de 1971 os analistas dos mercados acordaram com uma situação insólita: nos bancos e casas de câmbio da Europa o dólar amanheceu sem cotação. Todas as moedas eram aceites, em taxas arbitrárias e quase aleatórias – menos a moeda norte-americana. A partir de então, o Dólar passou a valer o valor que lhe queriam dar os norte-americanos. Ou seja, as barras de ouro de Fort Knox foram substituídas pelos Mísseis. Significa isto que os Estados Unidos passaram literalmente a pagar a sua dívida externa com a emissão de papel verde impresso em quantidade quanto baste, apoiados numa rede de mais de 1000 bases militares espalhadas pelo mundo.

clique na imagem para ampliar

Desde 1979 (com o segundo choque petrolífero) até ao crash bolsista de 1987 a massa monetária criada cresceu duas vezes e meia. Em menos de uma década atingiu 1,9 triliões de dólares quando em 1979 era de 838 mil milhões. A saída para essa crise foi a mesma que hoje em dia está a ser aplicada: a impressão de dinheiro falso (porque não corresponde a bens reais). Entre 1987 e 1991, em apenas 4 anos, a massa monetária voltou a crescer, de 1,9 T para 3,1 Triliões, ou seja, aumentou 160% . A chamada “retoma” (capitalista) chegou pela via do costume: administrações a roçar a ditadura em beneficio dos ricos (Reagan, Tatcher) sanções sobre o Iraque e a Guerra do Golfo. Em Portugal a coisa começou a notar-se com a arribada a São Bento dessa sumidade económica que dá pelo nome de Cavaco Silva e que é hoje presidente do país mais miserável da Europa.

De 1991 até aos crash do ano 2000, a emissão de dinheiro ficticio assumiu foros de loucura total (o Neoliberalismo, aplicado desde 1973 no Chile saiu da América Latina e espalhou-se pela mão do FMI e do Banco Mundial por todo o globo). Em 1991 a massa monetária global em circulação, que era de 3,16 Triliões tinha-se expandido em 1999 para cerca de 11,6 Triliões, ou seja, quase que quadriplicou!
Em 2001 a queda bolsista no Nasdaq tinha destruído cerca de 3 Triliões de dólares. O 11 de Setembro e a administração Bush embaralharam e deram as cartas de novo. Em 2003 com a invasão do Iraque o volume em Bolsa retornou aos 10 Triliões, e os activos salvos nas “novas tecnologias” passaram a ser literalmente investidos em tijolos; Em 2007 a bolha no imobiliário à beira de rebentar assinalava o seu maior valor de sempre: 13,3 Triliões. Em 2008 esse “valor” tinha-se evaporado de novo para os 8,7 Triliões.

"Desesperados por preservar o valor dos activos inflaccionados por esta enorme bolha de liquidez, os políticos (como se fossem eles que decidissem o que quer que seja) recusaram a solução dolorosa. As injecções de liquidez com dinheiro criado de novo, os programas de resgate, a garantia dos depósitos e os pacotes de estímulo fiscal visaram suster os preços dos activos, quando o que lhes fazia falta era que caíssem para o seu valor real, para que pudessem ser apagados. Os políticos apenas estão a prolongar a crise” David Roche, in The Wall Street Journal.


Em 2012 a pirâmide invertida que "sustenta" a economia mostrava que apenas 10% do PIB mundial correspondia a dinheiro medido por reservas de ouro. 122% correspondia a papel-moeda. 142% a Titulos de Dívida transformados em créditos bancários, nomeadamente créditos hipotecários manipulados em títulos negociáveis em mercados; e 802% em acções sobre produtos Derivados (contratos complexos sobre dinheiro a ganhar no futuro) ou seja, nas condições actuais: Lixo. Tudo somado, estes “valores” “representam” 966% sobre o PIB real mundial. Para os países no Ocidente que aderiram ao esquema de Ponzi norte americano (chamam-lhes economias avançadas) as perspectivas não são portanto animadoras.

5 comentários:

Fada do bosque disse...

Há várias razões, sobretudo de ordem ideológica, mas a principal delas está no campo da economia política: diante da crise, os ortodoxos preferem políticas do lado da oferta (redução da taxa básica de juros) porque as políticas do lado da demanda – ou seja, aumento dos gastos públicos - ao contrario das primeiras, são geralmente redistributivas de renda a favor dos mais pobres. Gastos fiscais são aplicados em infra-estrutura e serviços públicos. Taxa de juros baixa favorece sobretudo os ricos que têm garantias reais para tomar empréstimos.

A crise atual tem uma dimensão ideológica adicional por causa da escala da dívida e dos déficits em alguns países europeus como Grécia, mais de 180% do PIB, e da Itália, mais de 120%. Antes dela, a situação fiscal na zona do euro, exceto na Grécia, era extremamente confortável, muito abaixo dos parâmetros do Tratado de Maastricht que institui o euro (máximo de 60% do PIB para a dívida, e de 3% do PIB para o déficit público). Contudo, porque os governos tiveram de salvar os bancos, a crise financeira vinda dos EUA se converteu em crise fiscal em larga escala.

A idéia de que se tem de reduzir déficit e dívida como condição de retomada é um disparate. O corte nos gastos públicos reduz a demanda, o emprego, o consumo interno e a própria receita fiscal, aumentando a relação déficit-dívida/PIB. A medida é, pois, contraproducente. Assim, independentemente do nível do déficit e da dívida, o primeiro movimento sempre terá de ser no sentido de aumentá-lo a fim de estimular o consumo, o emprego e o investimento. O movimento seguinte será no sentido da redução da relação déficit-dívida/PIB. É nesse ponto que entra em jogo a articulação tesouro nacional/banco central, da qual os países do euro estão excluídos.

http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19929&editoria_id=7

Normalmente, o tesouro emitiria dívida, e o banco central facilitaria a colocação desses títulos no mercado, como nos EUA. Acontece que o BCE é descolado dos tesouros europeus, um leviatã monetário que tem como mandato único evitar a inflação e pouco interesse em desenvolvimento. Com isso, os países, para aumentarem os gastos públicos recorrendo a endividamento, têm que ir diretamente ao mercado privado. O mercado comandará a taxa de juros e a disponibilidade de recursos de empréstimos, ditando soberanamente as crises entre os países.

Fada do bosque disse...

Olá xatoo... desculpe que me enganei no link...

http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19928

xatoo disse...

"A política keynesiana atua pelo lado da demanda, enquanto a política ortodoxa pretende atuar pelo lado da oferta"
Isto é um bocado confuso. Oferta e procura de quê? de dinheiro? com mais juro ou menos juro? como o autor decerto não é marxista não se percebe patavina. Partindo do principio de que só o Trabalho cria valor e que o Capital nada mais é que trabalho acumulado, não se percebe porque é que se há-de começar a equação pelo lado do dinheiro.
O problema, como se tenta fazer ver neste post, está no excesso de dinheiro em circulação, que não serve para medir coisa nenhuma.
Como se vê no penúltimo gráfico: "Tudo somado, estes “valores” “representam” 966% sobre o PIB real mundial". Portanto, é de irradicar da equação tudo o que não seja Trabalho que se tem de tratar para resolver a crise pelo lado dos interesses da quem trabalha
x

Fada do bosque disse...

Pois, actua pelo lado da procura... e da oferta... li o post do xatoo antes de ter lido este da Carta Maior e realmente, achei que não dava para perceber.
Obrigada pelo esclarecimento

Karocha disse...

Fada e xatoo
Para perceber estas coisas é falar com o meu rapaz.
Quando do BPN entrava em casa aos gritos "Falência isto é um caso de policia" e do BPP a mesma...