Pesquisar neste blogue

terça-feira, agosto 29, 2006

“Deutschland im Jahre Null”

Os historiadores das diversas facções em palco que reescrevem a História, cada qual à sua maneira e consoante os interesses próprios em jogo, continuam a debater se teria havido a necessidade da destruição provocada pelos bombardeamentos aliados, hoje considerados criminosos, primeiro do pouco conhecido sobre Hamburgo e depois, mais dramatizado embora menor sobre Dresden, numa altura em que o Exército Vermelho estava já às portas de Berlim e o nazismo se encontava práticamente derrotado.

Germania Ano Zero – 1947” é um filme de Roberto Rosselini que, em função dos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, marca um corte na obra do realizador de “Roma Cidade Aberta” com o entendimento do mundo antes de se conhecer a deliberada destruição massiva e em grande escala. Aqui se desfazem os equivocos que pudessem porventura permitir a continuação despudorada da designação de “sucesso comercial”. – apesar de um prémio no festival de Locarno, começou aqui também o “anno zeroda incompreensão e solidão do celebrado realizador. O que censurou especificamente a crítica? A fragmentação da narrativa, que lhes parecia arrastar-se por pontos fracos em prejuizo das lérias nihilistas da pseudo “intendidade dramática” e a ausência de “heróis positivos”, o que implicaria uma ambiguidade politica. Efectivamente, aqui as crianças já não nos apontam o futuro, mas emergem e mergulham nas ruínas e na morte, no décor expressionista transfigurado que cerra o espaço e o tempo, sem aberturas nem concessões. Os primeiros seres humanos que nos surgem estão num cemitério, os últimos nos escombros – o mesmo guião agora decalcado ao milimetro e ressuscitado por Joaquim Sapinho nos seus quase despercebidos para o grande público “Diários da Bósnia” É dos livros; daqueles pensados e editados pelos censores de funções diluidas pelo acréscimo da função de programadores. Por exemplo no longinquo Portugal paredes meias com a inóspita “finis terrae” romana de gente desterrada e culturalmente pouco exigente, “Germania Ano Zero”, excepção feita a algumas, poucas, exibições em circulos cinéfilos restritos, permaneceu inédito comercialmente. Filmado com figurantes reais entre os escombros ainda frescos de Berlim, dele disse Rosselini:
“Pude filmar “Germania, Anno Zero” exactamente como queria e hoje, quando revejo a obra, ainda fico comovido com os resultados. Creio que o meu juizo sobre a Alemanha estava certo. No entanto, e contra toda a expectativa, o acolhimento feito a “Alemanha, Ano Zero”, foi muito mau e foi, nessa altura, que comecei a formular algumas interrogações. O mundo do cinema tinha-se reorganizado, reencontrara os seus hábitos e o seu estilo de antes da guerra. Alemanha Ano Zero era julgado com base numa estética anterior à guerra, tal como “Paisá” ou a “Roma” tinha agradado pelo que possuiria de novidade em relação a tal estilo. Por outro lado, também o mundo politico se havia reorganizado e o filme era julgado em função duma nova política. As críticas a Alemanha Ano Zero revelaram-me o que os jornalistas pensavam do problema alemão (ou o que sobre ele pensavam os directores dos jornais em que escreviam) mas não me foram de nenhuma utilidade no plano crítico. Mas tive, então, a clara consciência de estar perante um dilema: ou a prostituição, ou a sinceridade

O ponto mais alto de Berlim é uma elevação de 120 metros de altura situada nos distritos de Charlottenburg- Wilmersdorf, onde um imenso parque arborizado sepultou a realidade no esquecimento. A colina, chamada Tefelsberg, foi criada artificialmente a partir do pós-guerra reunindo no local 100 milhões de toneladas dos escombros da cidade. Devido à falta de homens, durante anos, a recolha desse entulho foi um trabalho duro realizado por mulheres. A cumprir a função da neve, como nos “Diários da Bósniaque soterra o terreno pisado pelos sobreviventes e lhes tenta apagar em vão a memória, aqui na pacatez deste bosque, o pipilar dos passarinhos não faz esquecer a razão porque os berlinenses chamam à colina “a Montanha do Diabo”. Por uma evidência simples – por iniciativa dos novos ocupantes americanos, no alto do monte foi erguida uma aparatosa estação de controlo de telecomunicações vindas do Leste, trabalhando afanosamente na descodificação das mensagens oriundas do sector comunista – montada e com exploração a cargo do Instituto para Segurança Nacional Americana, (ASASA) esta foi uma das precoces e injustificadas manifestações daquilo que viria a ser designado por “guerra fria”, um confronto também ele artificial, como a colina de escombros onde assenta a construção - previamente programado, como aliás o são todos os potenciais conflitos, que gerem dividendos aos cada vez menos invisiveis donos do mundo.


de tudo isto, hoje sobra em Berlim um enorme catrapázio, na Porta de Brandenburgo, onde os turistas tiram fotografias à realidade que já não existe. Por esta linha passava o Muro, o famigerado icone da Guerra Fria. É por aqui que andarei nestes próximos dias,,,

Falando de escombros, ao fim de 28 anos, 193 torres de vigia construidas, 5000 refugiados, 155 quilómetros de extensão, a maior carga politica do século XX apesar de apenas ter causado192 mortos, ruiu em 1989 o nomeado pelo sector leste como sendo o “Muro de Protecção Anti Fascista” (“Gedenkstatte Berliner Mauer”). Da demolição resultaram mais 1 milhão de toneladas de cascalho.
Das três formas politicas que se defrontaram durante e no depois da Grande Guerra – o totalitarismo Fascista, o regime Estalinista e o New Deal americano, todos produto da sua época – de comum, além do entulho, fica-nos a constatação de que todas elas foram formas politicas adequadas à era da Técnica e que, subsiste o trauma totalitário provocado pelo refinamento do uso da tecnologia e da Ciência. É este modelo de Desenvolvimento que deveremos questionar, se quisermos evitar a produção de mais escombros – incompatíveis com a Natureza e com a finitude dos recursos do planeta Terra, de cuja biosfera a Humanidade, toda ela, na sua multidiversidade é parte integrante.

Gaza e Libano, 2006
o neo-fascismo aparentemente vencedor
e a "liberdade" multinacional de
continuar a produzir entulho

segunda-feira, agosto 28, 2006

New Orleans, um ano depois da tragédia,,,

,,, que tinha sido começada a preparar muito antes - a Natureza concluiu a tarefa.
Sabe-se agora que são poucas ou nenhumas as probabilidades da cidade ser restaurada para aí voltarem a viver a maioria dos pobres que a habitavam. O novo documentário de 4 horas do prestigiado realizador Spike Lee (a acção do governo foi criminosa, disse ele) "When The Levees Broke: A Réquiem in Four Acts" a exibir na cadeia de televisão por cabo HBO, levanta a questão de alguns diques terem sido arrebentados propositadamente para salvar as zonas residenciais dos ricos. Um ano depois, de uma cidade com meio milhão de habitantes, apenas voltaram 140 mil cuja maioria vive em roulotes em situação precária. Para a "Newsweek" trata-se do melhor trabalho de sempre, e o de maior importância na carreira de Spike Lee.


entretanto,,,
a Louisiana, foi o segundo Estado dos EUA a proibir o aborto

Até o furacão Katrina devastar o Golfo do Mississipi, a governadora Kathleeen B. Blanco era considerada como uma estrela ascendente do Partido democrata nos EUA. Antes, esta mulher de firme convicção de governo de tradição liberal, após ter-se batido contra a horda de políticos machos, abarcando do Grande dragão do Klu Klux Klan ao secretário da Saúde da administração Bush, comprometida à esquerda do partido, não tinha hesitado em visitar Cuba e a jantar com Fidel Castro.
Contudo, em Fevereiro de 2004, numa estranha reviravolta prestou o seu apoio à ocupação do Iraque aquando de uma viagem a Bagdad patrocinada pelo departamento da Defesa. Em Agosto de 2005, tornou-se responsável pela amplitude dos estragos causados pelo furacão na medida em que o seu apoio à ocupação do Iraque a levou a autorizar o envio de 3.000 membros da Guarda nacional pertencentes a essa região; homens cuja ausência de facto a privaram dos meios indispensáveis para responder à catástrofe. Contudo, estes guardas cidadãos não só não cumpriram com os apoios devidos às vítimas: com efeito, Kathleen Blanco deu ordem aos bandos de Guardas restantes para fazer fogo e abater os desesperados que procuravam sobreviver depredando tudo o que estava ao seu alcance. Em 7 de Junho de 2006, a governadora Blanco, mulher e democrata, anunciou que ratificaria uma lei que proibe o recurso ao aborto em todos os casos, incluindo a violação e incesto, excepto quando a vida da mãe está perigo. Os médicos ou parteiras abortadeiros incorrem em 100.000 dólares de multa e 10 anos de prisão como qualquer criminoso. A Louisiana é o segundo Estado, após o Dacota do Sul, a adoptar tal legislação em contradição com a jurisprudência do Supremo Tribunal dos Estados Unidos de 1973.

domingo, agosto 27, 2006

“Fazemos a distinção entre o judaismo como religião, e o sionismo como expressão politica de carácter racista e expansionista É esta segunda que questionamos e denunciamos”.
Denise Shomaly, sobre o holocausto palestiniano














Anti (Semitismo – Judaísmo – Israelismo – Sionismo):
algumas diferenças

um artigo de Paulo Mendes Pinto, historiador de religiões, no Publico 13 Agosto

“Num momento em que a guerra de Israel contra o Hezbollah parece já não vir a ser um conflito-relâmpago, uma incursão cirúrgica, urge olhar para as palavras que usamos com cuidado redobrado, fugindo à leveza da fugacidade das realidades passageiras.
De facto, no actua mundo do fast food intelectual e cultural, assistimos constantemente ao abusivo uso de determinados conceitos, de vocábulos que nesceram com definição clara do seu sentido, mas que, pelo seu uso muitas vezes irresponsável, o perderam por completo, lançando um caos pantanoso onde tudo pode ser dito.
Não se trata de um purismo linguistico, mas sim de um esforço que é necessário fazer para afastar muitos mal entendidos e muitos juizos de valor.
E é importante tratar as realidades com nomes que, de facto, se lhes aplicam, porque os nomes, as palavras, querem dizer alguma coisa, criam nuances de sentido, subtilezas de pensamento. A generalização de certas expressões que deixam de ter um sentid claro é uma das mais profundas provas de iliteracia.
O caso dos quatro vocábulos usados em titulo é significativamente importante porque nos obriga a um exercicio de pensamento em que se separam fenómenos diferentes. Sem se compreenderem, nas suas especificidades, esses fenómenos, podemos estar a lançar os conflitos para campos ainda mais dramáticos, criando assim uma nova conflitualidade.
Esta conflitualidade criada nas opiniões mediante o uso de certas expressões pode levar a reacções extremadas por parte de grupos islâmicos e judaicos, dificultando o diálogo e lançando ainda mais discórdia: o uso errado de certas palavras leva-nos para um, horizonte de criação de uma guerra virtual em torno de judeus, islâmicos e “ocidentais”.
Históricamente, o “anti-judaismo” nasceu primeiro. Baseado na ideia de que os judeus mataram Jesus, o Cristo, o Deus Vivo, criou uma máculaque se estendeu por dois milénios. Culpados do deícidio, os judeus foram perseguidos por praticarem uma religião que conduziu a esse crime máximo, constantemente considerados um dos males do mundo.
O “anti-semitismo” difere da noção anterior porque perdeu a carga religiosa e se abriu ao horizonte mais largo do mundo semita. Um anti-semita não persegue um judeu porque ele pertence a uma religião, a um grupo humano, que optou por matar Jesus. O anti-semitismo existe porque vê nos judeus os descendentes de uma raça inferior, os semitas. Ora, duas considerações há a fazer: 1) este fenómeno está plenamente enquadrado numa Europa que não integrou as comunidades judias, e que via nelas algo de exterior a si mesmas (os semitas não eram europeus, eram asiáticos); 2) esta palavra teve maior expressão aplicada a judeus, mas designava genericamente todas as populações com origem no Médio Oriente, incluindo árabes e islâmicos.
Desta forma, o que se passa em Israel, na Palestina e no Líbano nunca pode ser designado como anti-semitismo: ambos, palestinianos e israelitas, são semitas. Donde, é a noção de “anti-israelismo” que deve ser lançada em campo, em detrimento da anterior. E este campo já tem pouco a ver com a religião, já pouco tem a ver com a visão de raças inferiores, em tudo tem a ver com uma delimitação de um Estado, em tudo tem a ver com a delimitação das fronteiras e com as resoluções da ONU que obrigavam Israel a confinar-se a uma determinada linha fronteiriça.
Ser anti-israelita não implica uma posição anti-semita. Um dos “anti” é de natureza rácica, o outro é de natureza politica. Mas, obviamente, nada é linear. Transversalmente, há ainda a ideia de “anti-sionismo”, conceito de mais dificil definição.
O moderno sionismo nasce no século XIX e tem como objectivo o restabelecimento de uma pátria judaica no espaço do antigo Israel. Muito do anti-semitismo do século XIX nasce por oposição às linhas de poder de grandes familias judias que fomentaram esses discursos de regresso à Palestina. Para muitos, esse regresso implicava um domínio comleto e total da região, enão apenas de um teritório mais pequeno. Pretendia-se, míticamente, alcançar os vastos domínios de David e Salomão, recriando uma certa ideia de Império, de dominio muito acima do nacional. Complexificando ainda mais um pouco, o facto de o Estado de Israel ser um Estado judaico, e de os judeus pelo mundo fora se sentirem solidários com essa nação (muitas vezes com dupla nacionalidade simplesmente por serem judeus), provoca o esbatimento dos conceitos anteriores. Por analogia, as reacções às comunidades judias fora de Israel são como que um ataque a Israel na medida em que há uma relação próxima entre essas duas realidades.
Muito se ganharia se as palavras fossem usadas correctamente. Muito do que do conflito latente se tem criado na Europa poderia talvez ser evitado, ou amenizado, se quem escreve ou fala sobre estas questões não falasse, por exemplo, constantemente em anti-semitismo, relançando um fantasma que, agora, quase não existe. Se continuarmos a falar tanto dele e da forma como o temos feito, talvez o ressuscitemos...”


sexta-feira, agosto 25, 2006

Cuba, Imagens e Testemunhos (II)- António Tabucchi










Encontro com o Pereira

“Era uma praia enorme, de areia branca, selvagem, com pequenas palmeiras de coco e o mar azul de turquesa, como um postal. À beira da praia havia uma barraca de canas com uma mesa de madeira plantada na areia. O fogo de lenha estava aceso e um homem de idade grelhava peixe. Num banco estava abandonado um boneco de trapos da altura de uma pessoa. O viajante aproximou-se e perguntou ao homem se era um pescador.
Não, respondeu o homem, sou o restaurante, isto é o restaurante Pereira, mas não sou sózinho, somos uma cooperativa. E os outros?, perguntou o Viajante. A cozinheira tinha o filho doente, respondeu o homem, e o meu ajudante tinha de se ocupar do neto, de maneira que estou sózinho, e assim só veio o Pancho, o Pancho anda sempre comigo, o senhor quer almoçar? Quem é o Pancho?, perguntou o Viajante. É aquele, respondeu o homem apontando para o boneco. E depois disse: agora grelho peixe, mas já fui actor, sabe, estudei o método Stanislavskj em Ciego de Ávila, e aliás fez-me bem porque na minha juventude era um rapaz muito tímido. Ah, sim, respondeu o Viajante, pois.
Trabalhei em La Habana, continuou o homem, ao principio num teatro para crianças, e depois no cabaret, mas veio o Periodo Especial, já ninguem vinha ao teatro, era uma miséria, voltei para a minha terra e fundei esta cooperativa, o senhor sabe o que é o Periodo Especial? Não faço ideia, disse o Viajante. É quando cairam os soviéticos, não tínhamos mercado nenhum, a nossa pobre economia... plof! Água e papo seco, e adeus ao teatro, isso é que era o Periodo Especial. Agora com o turismo é diferente, o senhor quer almoçar? O senhor é um turista, felizmente. Sou um Viajante, disse o Viajante, os turistas em geral não gostam de ser turistas, o que há para o almoço? Peixe, respondeu o homem, só peixe, mas é muito fresco, e umas frutas que para si são tropicais, pode sentar-se se quiser. O Viajante sentou-se. O mar estava ainda mais azul, ainda mais convidativo. Sim senhor, disse, quero um peixinho qualquer, e ujm pouco de fruta, uma coisa ligeira, vou tomar banho. Quer um almoço simples ou com espectáculo?, perguntou o homem. Qual é a diferença?, perguntou o Viajante. Com espectáculo sou eu que actuo com o meu Pancho, eu sou ventriloquo, eu actuo e ele fala, mas o senhor não dá pela diferença. E qual é o repertório?, perguntou o Viajante. Oh, muito variado, respondeu o homem, duma canção do Buena Vista Social Club, que agora está na moda por causa daquele realizador, até ao monólogo de Hamlero, o que o senhor quiser. E as duas coisas juntas é possivel?, perguntou o Viajante, é que eu também tive o meu Periodo Especial, e as duas coisas juntas condizem-se. Claro que é possivel, respondeu o homem, tudo é possivel na vida. E virou o peixe na grelha”
.

quarta-feira, agosto 23, 2006

SNS, gratuito mas pago

"A ideia peregrina de que a saúde é um bem como qualquer outro e quem a quer terá de pagar por ela é uma ideia retrógada e anti-social, que penaliza os mais doentes e exclui dos cuidados de saúde os cidadãos de mais débeis recursos"
Octávio Teixeira, DN 14 de Agosto

já é assim, mas vai ser pior

* Bagão Felix, no Semanário Económico: "O sistema de Saúde deve passar por uma revisão muito grande na sua forma de financiamento. E alguma coisa vai mudando. A Constituição diz que o Serviço Nacional de Saúde é tendencialmente gratuito e hoje em dia já podemos dizer que é tendencialmente pago" - compreendemos: é gratuito pago.
Por alguma razão os grandes investimentos dos grupos bancários de momento são no sector da Saúde privada.


Uma das razões porque a Lei da Interrupção Voluntária da Gravidez ainda não foi aprovada,legitimada pela maioria absoluta existente no Parlamento, sem passar antes pelo crivo folclórico do "referendo", será decerto porque as obras das clinicas privadas a cujos serviços preferencialmente as clientes irão recorrer, ainda não estão concluidas. Uma representante de uma dessas clinicas, espanholas onde se pratica o aborto, afirmava então, muito antes de Sócrates ter sido eleito:


"Um administrador de hospital deve estar sempre a pensar: "por causa das minhas jantes de liga leve quantas análises a velhinhos não foram feitas?"
Ferreira Fernandes, CM 21/8

terça-feira, agosto 22, 2006

Isabel do Carmo responde aos porta-vozes do "povo eleito"





















Esther Mucznik diz no seu artigo “A compaixão como instrumento do ódio” no Publico de 4 de Agosto de 2006 que “Como dizia Gobbels, uma mentira muitas vezes repetida acaba por ser credível. Que o diga Isabel do Carmo que, em absoluta sintonia com a contra-informação árabe, afirma que “Israel nunca esteve em sitio nenhum ou esteve vagamente há 2000 anos”.
Sinto-me no direito de responder, mas também é uma boa oportunidade para falar do que é ser judeu e do que é Israel.
De facto, Israel esteve por ali “vagamente há 2000 anos”, e não no território do Estado de Israel actual. Ou antes disso, no tempo em que foi registado o Antigo Testamento, a população que se designa por judia fazia parte dum puzle de povos, um cladeirão onde havia nómadas e agricultores, com migrações, alianças, cruzamentos. Esse povo acabou por se estabelecer nos reinos de Judá e de Israel, onde é hoje a Cisjordânia, sem acesso ao mar. Houve a ocupação romana, houve invasões. E o caldeirão de povos ficou, distribuindo-se de acordo com movimentações de poder e arranjos tribais. E assim aconteceu durante 2000 anos. Ficaram na região populações dos reinos de fé judaica, populações descendentes directas dos primeiros cristãos, grupos vários que se EM converter à fé islâmica e até bem mais para trás descendentes fenicios (não esqueçamos que Tiro, a bombardeada, é fenicia) e do que se pensa ser a origem dos etruscos. No meio disaso tudo vamos acreditar na fábula da “Terra Prometida” e no “Povo Eleito”? Para povo eleito já nos bastavam os outros, “os arianos”
Outra pergunta a fazer é o que é que têm os judeus da Europa a ver com isso? ÉW incorrecto falar de raças humanas, mas mesmo de acordo com esse conceito ultrapassado, não há “raça judia”. Raça judia só houve para os nazis. Não há narizes nem crâneos tipicos dos judeus, são análises grosseiras e superficiais. Há grupos como os Askenazis que de tanto praticar endogamia (tal como as populações das ilhas) acabaram por ter caracteristicas hereditárias comuns. Ora, por milagre é que os judeus oriundos da Europa Central, geralmente loiros e de olhos claros (como a própria Esther) hão-se ser descendentes de uma população do Médio Oriente, que naturalmente seria tão morena como os que lá estão? De facto, convém considerarem-se descendentes para justificar o regresso à “Terra Prometida”, à terra dos antepassados. Nem sequer se pode falar de uma etnia judaica. Estas comunidades da Euroa Central são populações convertidas à fé judaica, como outras foram convertidas à fé cristã e que, como comunidades relativamente fechadas, criaram a sua cultura. A Inquisição ibérica e as perseguições no resto da Europa reforçaram o seu carácter comunitário. Como fenómeno da cultura e resistência chegam para o orgulho duma comunidade, não é necessário inventar fábulas.
Esse regresso à “Terra Prometida” pretende justificar a ocupação do território do actual Estado de Israel levada a cabo em 1948, pela mão da Administração dos EUA com a cumplicidade da Grã-Bretanha, interessadas em ter uma ponta de lança na região. A minoria de oriundos da fé judaica que estava na região, estava integrada e não havia conflitos religiosos. Os que vieram ocuparam, expulsaram os camponeses das melhores terras, das que eram férteis e tinham água, praticaram terrôr nas aldeias, ocuparam as casas. Querem fazer-nos acreditar que se estabeleceram no deserto ou na floresta virgem? O acto fundador de Israel pode dizer-se que foi o massacre da aldeia palestiniana de Deir Yassine por aquilo que hoje chamaria os terroristas do Irgun, a 9 e 10 de Abril de 1948. A 14 de Maio proclamaram a fundação do Estado de Israel. Hordas de milhares de palestinianos fugiram para onde puderam. Para o sul do Líbano fugiram 400.000, em campos de refugiados, em aldeias. Organizaram-se como puderam. O Líbano é exemplar na integração de todas as culturas. Mas Israel foi atrás deles. Há 20 anos bombardeou Beirute, fustigou campos de refugiados, nomeadamente Chabra e Shatila (ataque da responsabilidade do futuro primeiro ministro Ariel Sharon), usou as milicias cristãs. Hoje volta de novo. Entre outras coisas estão a bombardear as casas que os emigrantes libaneses, tal como os nossos, construiram na terra de origem, com dinheiro economizado. É uma ilusão pensar que os palestinianos podem esquecer. Deixaram lá campos e casas, os jovens ouvem falar os pais e avós. A injustiça e a opressão são sempre uma panela de pressão. O ser humano não esquece.
O Hezbollah, goste-se ou não, é um partido organizado, tem deputados eleitos e foi a forma daquela população se organizar. Tem escolas, hospitais, assistência social. Não é uma organização terrorista e como tal não é considerada pela União Europeia.
Todavia o Estado de Israel é uma situação de facto. E já agora, as resoluções da ONU sobre a necessidade de um Estado Palestiniano também não são uma situação de facto?
EM diz que estou “em completa sintonia com a contra-informação árabe”. O que é que significa a palavra árabe? o Governo do Irão? Não são árabes, são persas islâmicos. Ou quer-se designar os governos corruptos, que estão sentados em cima do petróleo? ou a população indignada das ruas, que jamais esquecerá? “Contra-informação” é isso?
E já agora, a propósito do “crédulo leitor do Publico on-line” que fala das criancinhas judias a “assinarem dedicatórias nos obuses” destinados ao Líbano.

O que é que as crianças que vimos na televisão estavam afinal a fazer? O que é que elas estavam a escrever nos obuses? Serão objectos próprios para escrita de crianças sorridentes? Saberão elas o que é que aquilo vai produzir?
É pena que a comunidade judaica que se poderia orgulhar de uma cultura tão importante na Europa, com pensadores determinantes na nossa história – só falando de exemplos nos séculos XIX e XX, Freud, Marx, Einstein, Walter Benjamin, que aliás nunca se puseram debaixo do chapéu de chuva judaico – se volte para o mito sionista e se encarregue de fazer o “trabalhinho” da Administração americana na zona. Impedindo que as correntes democráticas e a revolução democrática ocorram naqueles paises.
É deselegante que EM meta Goebbels ao barulho para falar daquilo que chama as minhas “mentiras”. Mas já agora, de tanto se repetir a mentira de que aquela terra já era dos judeus, pretende-se fazer crer, sobretudo aos mais novos, que assim sempre foi? E de tanto se querer confundir anti-Sionista com anti-Semita, pretende-se prender as consciências do horror do holocausto e tolhê-las no combate aos senhores da guerra de Israel?

No rodapé da artigo a direcção do jornal redigiu a seguinte nota:
"NR – o Publico não alterou a grafia deste texto, designadamente o facto da autora escrever Holocausto com caixa baixa".
Sabe-se que o holocausto dos judeus, enquanto se ignora os assassinados por serem comunistas, ou de outras etnias como p/e os ciganos, se tem prestado a uma manipulação gigantesca no pós-guerra, tendo em vista branquear os crimes sionistas na Palestina. As antigas vítimas aprenderam na perfeição os métodos de genocidio e são hoje carrascos abjectamente exemplares.
Aqui fica um video que desmistifica a tese do exterminio dos judeus na única câmara de gás existente em campos de exterminio nazis - a de Auschwitz.

http://vho.org/dl/ENG/DavidColeatAuschwitz.wmv

“Se existiu um programa de exterminio organizado para matar todos os Judeus, como foi possivel sobreviverem tantos?”
David Irving, historiador britânico
"Para incinerar seis milhões de pessoas seriam precisos 15 anos, por isso há muito que explicar e contar"
Mohammed Taheri, embaixador do Irão em Lisboa

domingo, agosto 20, 2006

Os Sete Saberes para a Educação do Futuro

“Quer o indicador seja a totalidade da população ou a percentagem dos empregados ou desempregados, cerca de três quartos dos portugueses não passam da escolaridade básica ou nem sequer a têm. Com o secundário, estão qualificados 14 por cento. Mas o dramático que o trabalho de Eugénio Rosa revela é que, ao ritmo a que vimos a andar, teremos que esperar 89 anos para chegar à média comunitária actual, que é de 68,9 por cento – se olharmos para os números do abandono escolar e os projectarmos no futuro, mantendo a cadência do presente, um calafrio percorre-nos a espinha: teremos de esperar 140 anos para atingir a actual média europeia (...)
Santana Castilho, no “Publico” - ler mais, aqui do artigo "Atrás da Europa a passo de tartaruga"

Vale a pena ler o link atrás referido para nos apercebermos do caricato da situação que a Educação em Portugal atravessa . Contudo inverter este estado de coisas não será possível sem que haja uma ruptura radical com o sistema, o que, devido à nossa insignificância só será admissivel face aos guardiães da estupidificação de massas, quando se revolucione e se importe algo de novo a partir do exterior. Compare-se e veja-se como nunca através do reformismo se alcançarão metas (pseudo) pós-capitalistas já obsoletas, face aos objectivos civilizacionais que, já há muito, demasiado tempo de inacção, se configuram no horizonte.












Edgar Morin, Edições Piaget, 1999

do prólogo:
este texto antecede qualquer guia ou compêndio de ensino

Capitulo I – As cegueiras do Conhecimento: o Erro e a Ilusão

É espantoso que a educação que aspira a comunicar os conhecimentos permaneça cega sobre o que é o conhecimento humano, os seus dispositivos, as suas doenças, as suas dificuldades, as suas propensões para o erro como para a ilusão, e não se preocupe nada em dar a conhecer o que é conhecer.
Com efeito, o conhecimento não pode ser considerado como um utensilio ready made, que se pode utilizar sem examinar a sua natureza. Também o conhecimento do conhecimento deve aparecer como uma necessidade primeira que serviria de preparação para afrontar riscos permanentes de erro e de ilusão que não param de parasitar o espírito humano. Trata-se de armar cada espírito para o combate vital pela lucidez.
É necessário introduzir e desenvolver no ensino o estudo dos caracteres cerebrais, mentais, culturais dos cnhecimentos humanos, dos seus processos e das suas modalidades, das disposições tanto psíquicas como culturais que lhe permitem arriscaro erro ou a ilusão.

Capitulo II – Os principios de um conhecimento pertinente

Existe um problema capital, ainda desconhecido, que é o da necessidade de promover um conhecimento capaz de apreender os problemas globais e fundamentais para aí inscrever os conhecimentos parciais e locais.
A supremacia de um conhecimento fragmentado segundo as disciplinas torna muitas vezes incapaz de operar o vínculo entre as partes e as totalidades e deve dar lugar a um modo de conhecimento capaz de apreender os objectos nos seus contextos, nas suas complexidades, nos seus conjuntos.
É necessário desenvolver a aptidão natural da inteligência humana para situar todas as suas informações num contexto e num conjunto. É necessário ensinar os métodos que permitem apreender as relações mútuas e influências reciprocas entre partes e todo num mundo complexo.

Capitulo III – Ensinar a condição humana

O ser humano é em simultâneo fisico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico. É esta unidade complexa da natureza humana que está completamente desintegrada no ensino, através das disciplinas, e tornou-se impossivel aprender o que significa ser humano. É necessário restaurá-la, de forma que cada um, onde quer que esteja, tome conhecimento e consciência em simultâneo da sua identidade complexa e da sua identidade comum com todos os outros humanos.
Assim, a condição humana deveria ser um objecto essencial de todo o ensino.
Este capitulo indica como é possivel, a partir das disciplinas actuais, reconhecer a unidade e a complexidade humanas, reunindo e organizando conhecimentos dispersos nas ciências da natureza, nas ciências humanas, na literatura e na filosofia, e mostrar o vínculo indissolúvel entre a unidade e a diversidade de tudo o que é humano.














Capitulo IV – Ensinar a identidade terrena

O destino doravante planetário do género humano é uma outra realidade-chave ignorada pelo ensino. O conhecimento dos desenvolvimentos do ser planetário que vão aumentar no século XXI e o reconhecimento da identidade terrena, que será cada vez mais indispensável para cada um e para todos, devem tornar-se um dos maiores objectos do ensino.
Convém ensinar a história do ser planetário, que começa com a comunicação de todos os continentes no século XVI, e mostrar como se tornaram intersolidárias todas as partes do mundo sem, no entanto, ocultar as opressões e as dominações que devastaram a humanidade e não desapareceram.
Haverá que indicar o complexo de crise planetária que marca o século XX, mostrando que todos os humanos, doravante confrontados com os mesmos problemas de vida e de morte, vivem uma mesma comunidade de destino.

Capitulo V – Afrontar as incertezas

As ciências fizeram-nos adquirir muitas certezas, mas revelaram-nos, igualmente, durante o século XX, inumeráveis campos. O ensino deveria comportar um ensino de incertezas que apareceram nas ciências psiquicas (microfisicas, termodinâmica, cosmologia), as ciências da evolução biológica e as ciências históricas.
Haverá que ensinar os princípios de estratégia, que permitam afrontar os riscos, o inesperado e o incerto e modificar o seu desenvolvimento, em virtude das informações obtidas pelo caminho. É necessário aprender a navegar num oceano de incertezas através de arquipélagos de certezas.
A fórmula do poeta grego Eurípides, que data de há vinte e cinco séculos, está mais actual do que nunca: “O esperado nunca se cumpre e para o inesperado um deus abre a porta”. O abandono das concepções deterministas da história humana que acreditavam poder predizer o nosso futuro, o exame dos grandes acontecimentos e acidentes do nosso século que foram todos inesperados, o carácter doravante desconhecido da aventura humana devem incitar-nos a preparar os espíritos para esperar o inesperado e afrontá-lo. É necessário que todos aqueles que têm o cargo de ensinar se apresentem como postos avançados da incerteza dos nossos tempos.

Capitulo VI – Ensinar a compreensão

A compreensão é simultaneamente meio e fim da comunicação humana. Ora a educação para a compreensão está ausente dos nossos ensinos. O planeta necessita de compreensões mútuas em todos os sentidos. Dada a importância da educação para a compreensão, a todos os niveis educativos e em todas as idades, o desenvolvimento da compreensão necessita uma reforma de mentalidades. Tal deve ser a tarefa para a educação do futuro.
A compreensão mútua entre humanos, tanto próximos como estranhos, é, daqui para o futuro, vital para que as relações humanas saiam do seu estado bárbaro de incompreensão.
Daí a necessidade de estudar a incompreensão, nas suas raízes, nas suas modalidades e nos seus efeitos. Semelhante estudo é tanto mais necessário quanto se centraria, não nos sintomas, mas nas causas dos racismos, xenofobias, desprezos. Ao mesmo tempo constituiria uma das bases mais seguras da educação para a paz, à qual estamos associados por essência e vocação.

Capitulo VII – a Ética do género humano

O ensino deve levar a uma “antropo-ética” pela consideração do carácter ternário da condição humana, que é de ser em simultâneo individuo <-> sociedade <-> espécie. Neste sentido, a ética individuo/espécie necessita um controlo mútuo da sociedade pelo individuo e do individuo pela sociedade, quer dizer a democracia; a ética individuo/espécie apela no século XXI à cidadania terrestre.
A ética não saberia ser ensinada por lições de moral. Ela deve formar-se nos espiritos a a partir da consciência de que o humano á ao mesmo tempo individuo, parte de uma sociedade, parte de uma espécie. Trazemos em cada um de nós esta tripla realidade. De igual modo, todo o desenvolvimento verdadeiramente humano deve compreender o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e a consciência de pertencer à espécie humana.
A partir daí esboçam-se as duas grandes finalidades ético-politicas do novo milénio: estabelecer uma relação de controlo mútuo entre a sociedade e os individuos por meio da democracia e conceber a Humanidade como comunidade planetária. O ensino deve não só contribuir para uma tomada de consciência da nossa Terra-Pátria, mas também permitir que esta consciência se traduza numa vontade de realizar a cidadania terrena.

( a leitura dos capitulos completos encontra-se aqui)

sexta-feira, agosto 18, 2006

¡a Solução Final!

Alto! - pausa para rearmamento.











"o Mundo é um desastre" tinha declarado a secretária de Estado do Império, Miss Esperança Aguerrida, a este blogue. Uma equipa multidiscipinar de peritos, composta por bem esgalhados desenhos animados, reuniram-se na Disneylandia para procurar encontrar remédio para todos os males do mundo. E finalmente, mediante negociações ao mais alto nivel, encontraram-no.

Trata-se de tentar converter as partes ainda viáveis do planeta em diferentes parques temáticos que permitiriam a sobrevivência do sistema-mundo por um prazo de tempo indeterminado. No parque temático nº1, que se chamará da “Loucura”, que ocupará alguns dos maiores países da Terra, se assegurará o ensaio das novas politicas económicas da moda, ao mesmo tempo que se procede ao asfaltamento de grande parte do território.
No parque temático nº2, dito da “Devastação”, serão postas em prática as guerras necessárias para que possam ser mantidos desempenhos exemplares no parque nº1. Sobre o pessoal civil serão experimentadas todas as bombas de neutrões de último modelo.
No parque temático da “Liberdade”, a utilizar nos tempos de lazer, será permitido eleger para altos cargos dirigentes saguins transgénicos de dentaduras fluorescentes mediante o uso de computadores, e os visitantes serão premiados com bilhetes para um sorteio inexistente. Para acesso fácil ao parque, as obsoletas estruturas de transporte, incapazes de responder à crescente pressão de biliões de utilizadores, serão substituidas por uma complexa rede de montanhas russas.

relacionado - Ecologia Social:
"O Salva Vidas de Chumbo", por Eduardo Galeano

quarta-feira, agosto 16, 2006

Jornalismo (III)

los pueblos son dominados más por la mentira que por la fuerza
Simon Bolivar

Imprensa corporativa,
os cães de guarda da (des)ordem social

Uma comunidade internacional de jornalistas corporativos partilha dos mesmos valores-noticia. Segundo o prof. Nelson Traquina em "A Tribo Jornalista" (que seguiu o raciocinio de Chomsky) existe uma “novilingua” no discurso oficial – uma nova vulgata planetária iniciada por Orwell (1984) onde constam termos como “globalização”, “flexibilidade”, “governabilidade”, “exclusão” e “nova economia” – mas não constam os termos “capitalismo”, “classe”, “exploração”, “dominação”, “desigualdade”, etc.

Empoleirados na posição de árbitros das habilidades tecnológicas da Media, os jornalistas parecem isentos de qualquer crítica. Os seus mitos profissionais exaltam a autonomia, a liberdade, a busca individual, mas ignoram, quase em absoluto, a realidade social. Pierre Rimbert e Gilles Balbastre observaram (o pão nosso de cada dia):
"Na noite do dia nacional de mobilização, 10 de junho, a emissora de televisão TF1 dedicou três minutos e 47 segundos aos grevistas e manifestantes, contra 14 minutos e cinco segundos àqueles que os denunciavam. O mesmo equilíbrio na emissora France 2: o telejornal das 20 horas do dia 24 de Maio dedicara um minuto e meio à palavra dos manifestantes contra oito minutos e 50 segundos aos incómodos causados pelas greves".
ler mais aqui
nem vale a pena recordar a "overdose" que foi a cobertura do Mundial de futebol,,, que não teve concorrência nem contraditório à vista

para aprofundar o tema:
* Mencken
sobre jornalismo - www.gropius.hpg.ig.com.br
* “O Imperialismo Cultural no Fim do SéculoXX”, por James Petras
* “Teoria da Comunicação de Massas”, Denis McQuail, Fund. Gulbenkian (2003)

terça-feira, agosto 15, 2006

o Tempo e a Imagem

a condição feminina
a "Ceifeira" desenho de Álvaro Cunhal
circa década de 1940
Portugal

a mulher sacrificada pela Pátria, por Deus e pela Família












a condição feminina
a actriz Charlize Theron
Estados Unidos, 2006

a mulher sacrificada como fetiche de consumismo aos olhares lascivos de milhões de basbaques ateus, sem pátria nem dinheiro para sustentar familia




Direito Internacional

Saddam Hussein, lider do partido de cariz socialista Baas em 2003, destituido pela invasão americana do cargo de presidente do Iraque declarou não reconhecer autoridade ao tribunal fantoche que lhe fabrica a condenação, num arremedo de julgamento.



Liberdade de Expressão

Mel Gibson, popular actor australiano, radicado nos Estados Unidos, que ao ser detido pela policia de trânsito quando conduzia com indices de álcool acima do permitido, para esquecer a vergonhosa acção dos Sionistas de Israel na Palestina, se irritou com o agente berrando-lhe qualquer coisa do género: "fuck,s Are You a Jew"? "Você é Judeu, seu merdas?".
Pelo incidente, foi despedido da cadeia de televisão ABC, e impedido de continuar a série sobre o "Holocausto" que estava a filmar.

Fascismo

António de Oliveira Salazar, popularmente imortalizado como o "Botas" Chefe do Conselho de ministros durante o regime ditaturial de tipo fascista que agora os intelectuais neocons dizem não ter existido. Ficou famoso por ter enviado coercivamente trabalhadores e agricultores do atrasado Portugal, mascarados de soldados, "para Angola rápidamente e em força", de onde vieram corridos, com uma mão atrás e outra à frente, no pós 25Abril, pela luta entre imperialismos das duas superpotências em disputa.

Neo-Fascismo "democrático"

Anibal Cavaco Silva, o filho dilecto do 25 de Novembro, saído do Poço de Boliqueime, que após décadas de "desenvolvimento", fundos europeus roubados e letras de crédito bancário aos magotes, debaixo da rígida disciplina económica do Tio Sam e de Bruxelas profissionalizou os portugueses e envia-os agora de sua livre vontade, não só para Angola, mas para a Bósnia, Afeganistão, Timor, Iraque, estufas de morangos da Andaluzia, enlatar salsichas para o Yorkshire, ou where else onde, em desespero de causa, eventualmente se possa bulir para ganhar algum. Ainda há-de passar por ser de Esquerda.

sexta-feira, agosto 11, 2006

As Edições Inapa publicaram em 2002 um livro a que deram o titulo de “Cuba, Imagens& Testemunhos”. Nele prestam depoimento diversas figuras públicas, num leque tão abrangente que vai desde Jorge Sampaio, José Saramago e Miguel Urbano Rodrigues, passando por Luis Represas, José Fonseca e Costa até ao Eusébio da Silva Ferreira, à doutora Maria Barroso e ao hidrofilizado locutor Ricardo Costa da SIC, entre muitos outros das mais variadas áreas e tendências ideológicas. Desses testemunhos seleccionei o da página 68 prestado por Américo Amorim que transcrevo abaixo. Procurarei fazê-lo com alguns outros, que considero interessantes para o esclarecimento da realidade existente em Cuba que tantas vezes passa despercebida, quando não intencional e malévolamente diabolizada pelos arguidos do costume.

Os autores, João Villar e Alfredo Duarte Costa, embaixador em Cuba, com o presidente Fidel Castro Ruz

“Guardo as melhores recordações da minha primeira visita a Cuba no ano de 1978. Integrava então uma delegação de empresários portugueses que a convite das autoridades cubanas estudariam as possibilidades de aí estabelecer seus negócios. Não tive quiasquer receios então e não os tenho hoje.
Longo caminho percorremos e em Outubro de 1998 tive o grato prazer de receber na séde do Grupo Amorim o presidente da República de Cuba, doutor Fidel Castro Ruz, culminando exactamente vinte anos de cooperação estreita.
Hoje o nosso trabalho em Cuba estende-se a vários ramos da actividade económica, desde trading, até ao maricultivo, no turismo, construção de novas unidades e gestão hoteleira, etc. Tal como foi reconhecido, sabemos estar nos bons como nos maus momentos, sempre com o mesmo estado de espirito construtivo. É sem dúvida uma das experiências mais enriquecedoras que até hoje vivi”.






Américo Amorim

Empresário

Sabido como é, que Américo Amorim não é flor que se cheire, bastando para isso lembrar os recentes episódios em torno das ilegalidades cometidas na apropriação de um espaço público para urbanização do condominio privado de luxo do Convento dos Inglesinhos no Bairro Alto em Lisboa – imagina-se perfeitamente o que acontece quando estes grupos em busca da decuplicação de resultados apanham pela frente um Estado fraco e minado pela corrupção, que se está nas tintas para defender a ordem social, porque não são representantes legitimos daqueles por quem dizem ter sido eleitos - antes porque esse tipo de manhosos profissionais da politica são precisamente faustosamente remunerados por debaixo da mesa por esses interesses como fautores pró-activos da desordem.
Não tenhamos ilusões, o que está em jogo ácerca do hipócrita “recente velho interesse pela liberdade” que coloca a ecológicamente virgem Cuba na ordem do dia é ambição de decuplicação ad infinitum dos resultados económicos das piranhas capitalistas.

Hotel e Aldeamento turistico de Guamá, na peninsula de Zapata, uma das primeiras obras da Revolução. Por perto, outra atracção: o "criadero de crocodilos" que protege esta espécie autoctone até então ameaçada, pela "liberdade" natural dos caçadores furtivos.

Um tipo de desenvolvimento sustentado, de baixa densidade, que é um exemplo para todo o mundo. Compare-se. Olhem para o “nosso” Algarve e esbocem um esgar na face que vos reflecte o betão - aqui, onde podia estar um sorriso. É um prejuizo incalculável para os patos-bravos haver regulamentações rígidas que só permitem que se construa dentro dos perimetros urbanos. ( na foto de baixo: a Sierra Maestra, perto de Santiago de Cuba)

* Não perca o próximo episódio:

"o PORCO FALANDO DO TOUCINHO"

quarta-feira, agosto 09, 2006

A ilusão do consumo personalizado

dois artigos do dr. Beja Santos:

"Dos anos 70 para os anos 80 do século passado deu-se uma revolução silenciosa no fabrico em série que permitiu ascender ao individualismo como paradigma de mercado. A tecnologia permitiu as séries curtas e a miniaturização assegurou aos consumidores objectos mais leves, portáteis, pondo termo às obrigações do consumo semicolectivo. Foi assim que nasceram os fones, o televisor de pequeno ecrã, a alta fidelidade em todos os quadros da casa. Estas séries curtas continuam a desenvolver-se e dão origem, com a fragmentação dos media, à ilusão de consumos deliberadamente personalizados"
(ler mais aqui)

Falácias e equívocos da nova sociedade de consumo

Não é novidade para ninguém que a nossa época de hiperescolha tem como alavancas a ilusão da personalização do consumo e o princípio do prazer. O imaterial do consumo tem hoje um peso determinante, pela simples razão de que os bens e serviços pretendem dar satisfações materiais ou espirituais a partir de emoções, gerando o optimismo da compra, a moralidade da decisão no recurso ao crédito, e a própria ajuda humanitária, implícita a muitas aquisições ou promessas de conforto e bem estar, aparece associada à posse dos objectos. A desmaterialização do consumo está a ser muito conveniente para a esfera dos negócios.
(ler mais aqui)

terça-feira, agosto 08, 2006

Os calores imperialistas da época esparvoeirada

Sócrates, o caixeiro viajante contratado a recibo verde do sub- imperialismo lusófano, uma coisa de baixíssima intensidade a cargo de um enxame de sanguessugas de ainda menor competência, espera fazer um pino e trazer do colonizado Brasil para Portugal uma fábrica de avionetas a jacto para executivos, quer dizer, destinado a usufruto da classe de que ele próprio faz parte.
É caso para perguntar: e o que é que nós, cidadãos comuns com necessidades pautadas por outras prioridades, temos a ver com isso?,,, ou com as politicas iniciadas pelo Paulinho do Pentágono?

cada cavadela na Ota, cada minhoca da Embraer

Quem serão contudo estes "brasileiros da Embraer"? será que aquilo é deles?. Não é crivel. Numa primeira análise são os meros executivos subcontratados da holding "Embraer Liebherr Equipamentos do Brasil S.A.". Por sua vez, o "grupo Liebherr" é uma gigantesca multinacional de nome alemão criada em 1949 detida por capitais americanos ao abrigo do plano Marshall que controla mundialmente vastos sectores nas mais variadas áreas de actividade. Pois. Imaginem só quem são os accionistas que recebem a grana, sem sequer se darem ao incómodo de passarem pelo odioso de serem vistos como exploradores.
Ora, com as calças do papá Bush vestidas, qualquer sócrates se arma em gigantone, nem que seja pela glória efémera de uma tarde bem bombada nas festas da Senhora da Agonia, agora que o São Scolari foi de “vacanças” prá santa terrinha dar descanso á parolada.

óh pra nós! tão contentinhos com os nossos governantes, carago

segunda-feira, agosto 07, 2006



Pensar a economia de outro modo

Parece que é unânime que o nosso País enfrenta uma grave crise económica e social. O mesmo já não acontece quanto à identificação dos principais problemas, dos objectivos a atingir e dos caminhos a prosseguir. E não acontece, naturalmente, tendo em conta a natureza social da ciência económica, por onde perpassam os interesses e os conflitos de classe.

Contudo, o pensamento económico dominante de cariz neoliberal, cujo discurso é veiculado pelos principais órgãos de comunicação social, tenta apresentar como única, verdadeira e cientificamente comprovada, a sua visão dos problemas económicos e sociais, bem como do caminho para a sua resolução. Para o efeito, tenta dar a ideia de que todos estão de acordo (uns são prós e os outros a favor), socorrendo-se da opinião “insuspeita” de meios académicos ou de grandes instituições internacionais (como o FMI e a OCDE) ou da “voz” dos mercados, dos grandes grupos ou das agências de rating. Para isso, tudo faz para minimizar ou silenciar todos os que pensam a economia de outro modo. Sendo assim, nada há a fazer se não aceitar as receitas da “cartilha neoliberal”, que envolvem sempre sacrifícios para as classes trabalhadoras e de mais baixos rendimentos. Mas há sempre quem reme contra a corrente. Vem isto a propósito do recente lançamento dum livro do economista Eugénio Rosa, intitulado “Uma nova política económica ao serviço das pessoas e de Portugal” (*).
Trata-se duma importante obra, com exaustiva informação estatística, onde o autor analisa a situação económica e social do nosso País, nos últimos dez anos, apresenta algumas causas do agravamento dessa situação e aponta alguns contributos para uma política económica alternativa. Como indica o seu subtítulo, trata-se de “uma alternativa ao pensamento neoliberal dominante nos media e a nível oficial e mesmo académico”. Nesta obra, Eugénio Rosa enfatiza como uma questão central, a necessidade de colocar a economia ao serviço das pessoas (satisfação das necessidades humanas), ao invés da ideia dominante de pôr as pessoas ao serviço da economia (satisfação dos interesses dos grupos económicos). Como salienta o professor Mário Murteira, no prefácio do livro, há um discurso ideológico dominante que “oculta o essencial da realidade social a que respeita, em lugar de contribuir para desvendá-la e permitir a sua transformação positiva” (ler restante artigo de J.Alberto Pitacas)

do prefácio do Prof. Mário Murteira: "Como Eugénio Rosa mostra convincentemente, tem-se acentuado no nosso País a exclusão e a desigualdade. Não se trata, pois, de crescer pouco, ou mesmo de estagnar; trata-se de uma minoria enriquecer, enquanto a maioria empobrece em termos relativos ou mesmo absolutos. Esta caracteristica profunda da sociedade portuguesa é praticamente ignorada pelo discurso ideológico dominante (...)"






Eugénio Rosa (2006), "Uma Nova Política Económica ao Serviço das Pessoas e de Portugal", Editorial Caminho, Lisboa.

(*) lista completa de artigos de Eugénio Rosa, publicados no site "Informação Alternativa"

sexta-feira, agosto 04, 2006

5 minutos de história

clique na imagem para ampliar
Havana, final dos anos cincoenta. Cuba era então uma colónia para satisfação de vícios dos abastados parasitas do rico regime do continente a norte. Noventa por cento da área agrária era propriedade de multinacionais dos Estados Unidos. Na grande cidade proliferavam os bordéis, os casinos, as casas de penhores, joalharias luxuosas para adereçar prostitutas, traficantes de tudo o que é possivel e imaginário - enfim, toda uma fauna de agiotas e proxenetas que as economias de corrupção são férteis em produzir. Nem vamos mencionar o flagelo da droga, de que existem, e se arrastam por décadas os tristes exemplos dos paises das redondezas. Se a degradação atingia os niveis de prosperidade para alguns, poucos, que os comentadores ocidentais tanto apreciam, enquanto isso, os camponeses definhavam na mais negra das misérias no interior, sem terras, como ainda hoje, passados cincoenta anos, os brasileiros estão. Sem trabalho, como muito bem o sabem os milhões de "garotas de programa" do rico Brasil e não o sabem os meninos de Cuba, onde não há uma única criança sem habitação. Sem educação, como não o sabem os mais de 50 milhões de analfabetos que subsistem em toda a América Latina. Sem cuidados médicos, ainda por cima gratuitos, para desespero dos lobies farmacêuticos mundiais. A mortalidade infantil é de 0,7%, uma das mais baixas do mundo. Fidel Castro foi o primeiro Chefe de Estado a receber a medalha da "Saúde para todos" da OMS, em 12 de abril de 1988. Com os bens alimentares, embora que racionados, acessiveis a preços irrisórios para todos, como gostariam de poder usufruir, por exemplo, os 3000 sem-abrigo da cidade de Lisboa só para referir a zona do nosso país onde o nivel de vida é mais elevado, omitindo, por piedade, a miséria encapotada que vai por aí. Aquilo a que Vasco Pulido Valente alcunha de "antiga economia de sucesso" foi exemplarmente retratado na obra de Francis Ford Copolla "O Padrinho" (III) quando a máfia de Don Corleone, em vias de legalização, coligada com os politicos e os habituais enxames de consultores empresariais transferiram a gestão do jogo de Las Vegas e dos negócios clandestinos para Havana. Mau negócio. No dia 1 de Janeiro de 1959 em Havana apoiado por centenas de milhares de cubanos pobres e excluidos, como diz a velha canção "llegou el Comandante y la "brincadeira" se vaya a parar"!

Monróvia, 2006. Cincoenta anos depois a azáfama persiste. O tipo de sociedade pária onde falta tudo e as carências são criminosas mas onde , por contraste, os exportadores de bens de consumo arrecadam fortunas, fazem as delícias de intelectuais inebriados pelos vapores de "cubas livres" como Vargas Llosa. Barracas, amontoados de carros, carrinhos e carrões, estropiados da vida coexistindo com as indispensáveis televisões de plasma com locutores competentes incluidos no preço e enxergas de palha onde se dorme, bicicletas, micro-ondas , penicos Philip Starck, côcos, ipods, peixe seco infecto, fotos de gajas da Play-Boy, frigobares, tachos de aluminio encardido, telemóveis, preservativos anti-sida e restaurantes com estrelas Michelin. Para usar em perfeitas condições, condimentado pela inevitável liberdade (do mercado, essa entidade etérea), a facilidade de imprimir cartões de plástico que possam dar crédito às vítimas do consumo imbecilizadas por promessas mirabolantes,,, é a coroa de glória de qualquer troupe de economistas de sucesso, à custa da desgraça do endividamento alheio - Executivos que, à semelhança de qualquer pindérico ministro, vestem Armani e defecam em sanitas de design Villeroy&Bosh, vinte andares mais acima do chão onde os esgotos correm a céu aberto, o mesmo, onde correm velozes os jactos dos administradores da iniciativa privada.

Tal como no nosso 25 de Abril, os militares revoltosos que derrubaram a ditadura corrupta de Fulgêncio Bautista, eivados pelo espirito ético de "dar tudo ao povo sem lhe pedir nada em troca" - palavras então proferidas por Ernesto Guevara, apressaram-se a entregar o poder aos civis. Os orgãos da sociedade civil designaram Presidente, Manuel Urrútia. Em Abril, convidado por Roosevelt, Fidel Castro efectua a sua histórica viagem a Nova Iorque onde discursa nas Nações Unidas. Os norte-americanos cujos "empresários" tinham fugido a sete pés e abandonado aflitivamente à pressa e desordenadamente as "propriedades", ainda pensavam que estariam perante um tipo de regime passivel de ser "democratizado", onde ninguém fosse julgado nem condenado pelos crimes de lesa-pátria cometidos - enfim, como no nosso pós PREC, onde os interesses da Finança, da Banca e da agiotagem pré-existente se pudessem recompôr, quiçá ainda mais viçosos. Ninguém melhor do que nós, portugueses, para sabermos muito bem disso.
Em Cuba, perante os indícios de cooperação com os antigos exploradores do governo de índole social democrata, não tardou um ano que a população em massa nas ruas não exigisse que Fidel Castro assumisse as rédeas do Poder, em prol dos mais desfavorecidos.
Das primeiras medidas então levadas a cabo, a principal foi a mobilização geral de todos os professores do Ensino organizados em brigadas a todos os niveis, que partiram para os cantos mais recônditos da ilha em campanhas de alfabetização intensiva. Ao fim do 2º ano, o analfabetismo -incluindo a pior versão dele, como dizia Brecht - o analfabetismo politico - foi oficialmente dado como extinto. A Revolução ia começar.

quinta-feira, agosto 03, 2006

o portugal dos pequeninos

Os prazeres da boa mesa andam normalmente associados à má-lingua, segundo li por aí na capa de um livrito de culinária. Também as palavras saídas boca afora de um individuo amiúde alcoolizado não convivem pacíficamente com o pensamento ponderado de uma mente culta. Desta zaragata de emoções saiu uma das ultimas crónicas de Vasco Pulido Valente negando que em Portugal tivesse havido alguma vez uma ditadura, muito menos de indole fascista.

Ao cronista, que não resistiria muito mais tempo incólume às interpelações dos leitores quando se aventurou num blogue com comentários abertos, não lhe basta o episódio, amplamente glozado, de usar como pseudónimo o nome do avô, militante comunista perseguido e preso, para suspeitar que, por aqui, fora das estâncias balneares, havia “qualquer coisa”. Existem inúmeros estudos académicos de historiadores que desmentem VPV, mas neste meio de comunicação mais aligeirado, que são os blogues, para lhe chamar impostor não é preciso ir mais longe, do que à época em que se jogou na Peninsula Ibérica o destino do Socialismo.

Para além das perseguições internas, deportações e exilios conhecidos, obviamente, Salazar preferiu apoiar o combate ao inimigo longe da sua porta. Táctica que não envelheceu nem acabou por aí. Ainda um dia destes, Anne Coulter, que é uma espécie de VPV de saias do regime Neocon além-Atlântico, se saiu com a seguinte bojarda: “É preferivel combatermos o inimigo nas ruas de Bagdad do que em Nova Iorque, onde os habitantes embrutecidos pela inacção se renderiam rápidamente”.
Claro que isto é para ser levado a sério, tal e qual como o recado, útil aos guerrófilos acólitos de Cavaco, de que “o fascismo nunca existiu”. Nem tampouco Jorge Botelho Moniz, parente próximo do actual director da TVI – oficial do Exército, fundador do Rádio Clube Português, e cooperante activo nas brigadas Viriato juntamente com muitos outros da mesma laia, ao serviço dos assassinos franquistas, "existiram", ou são para ser, inconvenientemente, recordados. Nem O generalissimo Franco, que se assinava "Caudilho pela graça de Deus" teve, de certezinha, alguma vez qualquer relação com o "brando regime católico de Salazar".
cartaz franquista
A propósito da efeméride dos 75 anos da República Espanhola (1931-2006) no nº 105 da revista “Politica Operária” questiona-se: “Que espécie de democracia vigora em Espanha?”,transcrevemos:
“Só a pode tomar por uma democracia burguesa estável e “normal” quem esqueça que o actual regime saiu, por transicção negociada, de uma das mais ferozes ditaduras fascistas até hoje conhecidas, erguida sobre meio milhão de cadáveres”.
Neste aniversário do golpe militar de 1936 em Espanha, justifica-se uma pergunta aos que continuamente acusam a esquerda de ser adepta da violência: como, senão pela resistência dos trabalhadores em armas, poderia ter sido evitada a bárbara matança de Badajoz? Como, senão pela força, pode o povo impedir a repetição de tais monstruosidades?

Badajoz, Agosto 1936

“Em 1931, quando cai a monarquia e é proclamada a República, está eminente na Extremadura, como noutras partes de Espanha, um levantamento agrário. Como os sindicatos de operários agricolas exigem maiores salários e melhores condições de trabalho, os latifundiários reagem suspendendo os trabalhos agrícolas: “ a República que vos dê trabalho”. Com o desemprego a crescer nas aldeias, o povo começa a compreender que a República não se atreverá a limitar o poder dos “senhoritos”.
A lei da Reforma Agrária, adoptada em Setembro de 32 sob pressão do movimento camponês, não tem efeitos práticos. Em finais de 33 havia na Extremadura 35.000 assalariados agrícolas desempregados. No Inverno de 35-36, com a fome a alastrar nos campos, os trabalhadores agrícolas passam à acção. A 25 de Março de 36, sessenta mil camponeses da provincia de Badajoz ocuparam simultâneamente umas 3000 herdades e não se deixaram desalojar pela tropa. Iniciava-se a revolução agrária. É o ascenso do movimento proletário e camponês que determina a estrondosa vitória da Frente Popular nas eleições legislativas de Fevereiro de 1936 e que decide a oligarquia financeira e latifundiária a lançar-se no golpe de Estado. Contudo, apesar da sublevação militar eminente, o governo da República prosseguia na velha táctica de tentar aplacar a direita com concessões. Quase todos os cabecilhas da conspiração ocupavam postos de comando estratégicos, o que lhes deu vantagem desde os primeiros dias. A 18 de Julho, quando é declarado o golpe, os trabalhadores concentram-se em Cácerese Badajoz, reclamando armas para defender a República. Por toda a parte os governadores civis e a Guardia Civil recusam-se a armar o povo. Em Azuaga, a Guardia Civil dispara mesm sobre os trabalhadores, causando 17 mortes. Em Badajoz, só a decisão de milhares de camponeses e operários faz abortar a sublevação dos reaccionários. Entretanto já as tropas de Cáceres se haviam virado contra a República e a cidade caía nas mãos dos fascistas.

Perante a inoperância do governo republicano, formam-se por toda a Extremadura comités populares que assumem o poder. Os milicianos, em tremenda inferioridade de armamento, tentam travar o avanço das tropas rebeldes, mas são obrigados a recuar. A artilharia e a aviação alemã e italiana bombardeiam as localidades causando inúmeras vítimas civis. Em Almendralejo, onde a resistência republicana é particularmente forte, mais de mil pessoas são assassinadas depois de a cidade cair nas mãos das tropas mouras, legionários e falangistas. Em Talavera de laReina são fuzilados 600 camponeses. Mérida cai a 10 de Agosto. A 13 de Agosto, Badajoz é cercada pelos franquistas. A cidade, onde se amontoam os refugiados, estava a ser bombardeada desde o dia 9 pela aviação alemã e italiana, a qual partia com frequência de aeródromos portugueses junto à fronteira. Depois de horas de combates ferozes, os franquistas apoderam-se da cidade no dia 14 e desencadeiam uma matança como até aí não se vira. Durante a tarde e a noite centos de suspeitos de simpatias republicanas são arrancados das suas casas e assassinados nas ruas. Mas era só o começo. Pela madrugada, 1200 prisioneiros que tinham sido acumulados na praça de touros começam a ser ceifados pelas metralhadoras: milicianos e soldados, camponeses, jornaleiros, operários, pastores... Durante a manhã e nos dias seguintes o hediondo massacre prosseguiu, transformado em espectáculo, com a assistência de convidados (entre s quais latifundiários portugueses idos de Elvas e outras terras do Alentejo, como a abastado agricultor do Gavião, José Pequito Rebelo). O público sublinhava com aplausos a “lide” dos presos pelos falangistas, que usavam as baionetas como estoques. Quando os corpos na arena eram demasiados, camiões vinham retirá-los e a “tourada” recomeçava.
Calcula-se que tenham morrido nesses primeiros dias mais de 9.000 pessoas em Badajoz, entre comabtentes e assassinados, dos quais, mais de 4.000, sobretudo civis e milicianos, pereceram nas matanças da praça de touros.
Assim se cumpria a directiva circulada secretamente dois meses antes da sublevação dos generais: “Todo aquele que seja, aberta ou secretamente, defensor da Frente Popular deve ser fuzilado”. “Há que semear o terror, criar uma sensação de dominio, eliminando sem escrúpulos nem vacilação todos os que não pensam como nós” (Instrução Reservada nº1, de 25 de Maio de 1936)


Testemunhos

“Desde a queda de Badajoz, entre 50 a 100 pessoas são executadas diariamente. Os mouros e revolucionários estrangeiros saqueiam. A policia internacional portuguesa, sem querer saber do costume internacional, está devolver grande número de pessoas e centenas de refugiados republicanos a uma morte certa. Uma escolta a cavalo levou do posto fronteiriço do Caia para as linhas espanholas quatrocentos homens, mulheres e crianças. Destes, cerca de 300 foram executados. Em Campo Maior, um policia da alfândega diz-nos: “Claro que os estamos a entregar. São perigosos para nós. Não podemos ter vermelhos aqui em Portugal
(reportagem de Jay Allen, no “The Chicago Tribune”, 30 de Agosto de 1936

“Há dez horas que a fogueira arde. Um cheiro horrivel penetra-nos pelas narinas, a tal ponto que quase nos revolve o estômago. Ouve-se de vez em quando uma espécie de crepiatr sinistro da madeira. Ao fundo, num degrau cavado na terra, com o aprovetamento da diferença de nivel, encontram-se, sobre as traves de madeira transversais, semelhantes às que se usam nas linhas férreas, numa extensão talvez de quarenta metros, mais de 300 cadáveres, na sua maioria carbonizados. Alguns corpos, arrumados com precipitação, estão totalmente negros, mas outros há em que os braços ou as pernas, intactos, escaparam às labaredas provocadas pela gasolina que derramaram sobre eles. O sacerdote que nos conduz tenta explicar-nos: - “Mereciam isto. Além disso, é uma medida de higiene indispensável
(da reportagem, censurada e não publicada, de Mário Neves para o Diário de Lisboa, 15 de Agosto de 1936)

Claro que os fuzilámos. Julga que ia levar comigo 4000 vermelhos enquanto as minhas colunas avançavam numa corrida contra relógio?”
(declaração do general franquista Yagüe ao New York Herald Tribune, Agosto de 1936

“Fomos à praça de touros. Filas de homens, na maioria camponeses, com as suas camisas azuis, mecânicos de fato macaco. São os vermelhos. Estão a ser guardados. Às quatro da madrugada levam-nos para a arena. Há metralhadoras à sua espera. Disse-se que, depois da primeira noite, o sangue subia um palmo acima do solo. Mil e oitocentos homens - havia mulheres também – foram ali ceifados em doze horas. Há mais sangue do que se possa imaginar em 1800 corpos”
(Jay Allen, no The Chicago Tribune, 30/8/36)

“Os nossos valentes legionários e regulares ensinaram aos vermelhos o que é ser homem. De caminho, também às mulheres dos vermelhos, que agora finalmente conheceram homens de verdade, e não castrados milicianos. Espernear e gritar não lhes servirá de nada”
(general franquista Queipo de Llano, em Sevilha, 1936)

Para aprofundar o tema,
* leia-se o livro “A Guerra Civil de Espanha -Achegas para a compreensão da intervenção portuguesa" – por José Varela Gomes, um dos participantes nas Brigadas Internacionais que esteve preso em Cáceres - Editora "Fim de Século", de que não consegui encontrar o link.
ou ainda:
* "Negócios Com os Nazis - O Ouro e Outras Pilhagens, 1933-1945 de António Louçã

* "the Spanish Civil War" na Wikipedia

quarta-feira, agosto 02, 2006

agora,,, quando a cidade se esvazia

quando o silêncio se volta a abater sobre as ruinas abandonadas
uns pelas vicissitudes das guerras pela economia
em constraste com os prédios vazios noutros lugares trocados pelo lazer
de outros por beneficios das economias de guerra
compreendo o sentido das vidas dos que vão ficando, e vem-me à memória um poema de Fernando Correia Pina,


Sem abrigo

O meu lar está tão distante como Alfa de Centauro
se bem que fique do outro lado da cidade
que percorro de lés a lés, dia após dia.
Às vezes passo perto e olho a medo
através das minhas lentes de vergonha
e sigo ao largo, apressadamente,
não me vão confundir com quem já fui
ou achar-me parecido com quem sou.
Aprendi que um homem é uma espiga.
Um dia,
uma carta chega como uma foice
e o mundo desmorona-se.
Um dia,
um homem que antes era um barco ancorado
acha-se de súbito no meio da tempestade,
vê quebrarem-se todas as amarras
e a terra firme perder-se na distância.
Um homem tenta em vão caminhar sobre a água
moldar qualquer coisa com a água
fazer nascer qualquer coisa da água
mas... tudo se escoa entre os seus dedos
menos o tempo que escoar-se deveria
mas que ao invés se vai acumulando
como húmus onde cresce o esquecimento.
E todos me esqueceram...
E eu esqueci-os a todos...
A minha memória foi-se esvaziando
como uma árvore que não é regada –
as minhas raízes estiolaram,
os meus braços ficaram pendentes
como ramos secos, sem dar frutos
e o vento que me arrancou os sonhos como folhas
arrasta-me aos baldões de esquina em esquina.
Hoje vivo numa fábula moderna,
transformado pela vara de condão
de um mago da finança
num caracol que arrasta lentamente
a casa de cartão roubado ao lixo
pelo país da indiferença;
sou uma roda inútil na grande engrenagem,
uma sílaba supérflua na palavra progresso,
um nome feito em número, arredondado,
até ser só um resto de zero.


publicado na revista "Politica Operária"
assinaturas: 12,50€ por ano - enviando pedido para assinatura@politicaoperaria.net
ou preenchendo este formulário

*post-scriptum - o titulo de 1ª página do Publico de 4/8