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quarta-feira, janeiro 23, 2008

A Impostura Pós-Marxista

¿Será a "sociedade do Conhecimento" a solução para os baixos salários?
- A desregulamentação dos mercados de trabalho, postulada por Anthony Giddens, uma fotocópia dos boys de Chicago, (teólogo da 3ª via “socialista” de Tony Blair, quem não se lembra dele?), pelo contrário, está a contribuir para a manutenção dos baixos salários através do debilitamento do papel do Trabalho e dos Sindicatos.

Na sua análise da sociedade contemporânea António Negri sustenta uma visão refinada e erudita, “savant”, no dizer de Michel Husson (1), da tese do “fim do trabalho” popularizada com diferentes matizes por Jeremy Rifkin, Dominique Meda, Vivianne Forrester, André Gorz e a escola italiana dos teóricos da “intelectualidade das massas”, entre outros. Esta tese, que encontrou renovado eco na última década, pretende dar conta de uma suposta perda da “centralidade do trabalho” (com o desemprego de massas como uma de suas manifestações principais; quando de facto é o Trabalho que se deslocaliza para zonas de mais baixa remuneração) como conseqüência inevitável da passagem da “sociedade industrial” (o modo de produção Fordista) à erradamente chamada de “sociedade pós-industrial” (quando de facto a Indústria é subcontratada em regime de outsourcing em zonas de mais baixo custo). Nesta “sociedade pós-industrial, os avanços tecnológicos produziriam um salto na produtividade de bens materiais que a substituição progressiva do “trabalho vivo” pelo “trabalho morto”, de assalariados por máquinas (robôs e computadores, e entre eles o próprio Homem), se tornaria, em crescimento exponencial, uma tendência irreversível. A aplicação dos métodos “toyotistas” (subcontratação em outsourcing e assemblagem) na organização do trabalho (2) seriam, por sua vez, também produto dos avanços tecnológicos e da incorporação por parte do Capital das aspirações postas a nu pelo proletariado na “revolta contra o trabalho de Maio68”, que teve um efeito perverso: redundou no crescimento das funções de controlo e gestão do trabalhador em detrimento da Produção para satisfazer fins sociais. “Sociedade pós-industrial”, seria pois sinónimo da mutação das condições gerais do capitalismo na hegemonia do “trabalho imaterial” e “capitalismo cognitivo” (3). Segundo esta tese, nesta nova situação do capitalismo (cujos teóricos às vezes denominam como “pós-capitalista”) a actividade cognitiva advém do factor essencial de criação de valor, calculando-se este em grande parte fora dos lugares e do tempo de trabalho. O Conhecimento (quando o que vemos na prática é a politica selectiva, classista e privatizada de Ensino neoliberal) transformar-se-ia n“um factor de produção tão necessário como o Trabalho e o Capital, e a valorização deste factor intermediário obedeceria a leis muito particulares, a tal ponto que o “capitalismo cognitivo” (4) funcionaria de maneira diferente do capitalismo ‘comum’”, tendo como conseqüência que a “teoria do valor” já não poderia dar conta da transformação do conhecimento em Valor. O trabalhador já não necessitaria mais “dos instrumentos de trabalho" (ou seja, do Capital Fixo) que são postos à sua disposição pelo Capital. O “capital fixo” mais importante, aquele que determina as diferenças de produtividade, encontrar-se-ia no cérebro dos seres que trabalham: é a máquina útil que cada um de nós carrega em si. É esta a novidade absolutamente essencial da vida produtiva de hoje”. Esta tese apresenta um conjunto de unilateralidades que turvam a compreensão das condições contemporâneas do capitalismo e da luta de classes.

Esta visão que apresenta um desenvolvimento linear de uma situação de hiper-maturidade das forças produtivas é oposta à teoria que melhor dá conta das contradições do desenvolvimento histórico. Referimo-nos à teoria do “desenvolvimento desigual e combinado” originalmente formulada por Leon Trotsky para dar conta das peculiaridades que tornaram possível o triunfo da revolução proletária num país de desenvolvimento capitalista atrasado como a Rússia, sem que nos paises mais avançados e industrializados da Europa Ocidental a revolução advogada pelo Marxismo triunfasse: “As leis da história não têm nada de comum com o esquematismo epistemológico pedante" (5). O desenvolvimento desigual, que é a lei mais geral do processo histórico, não se revela, em parte alguma, com a evidência e a complexidade com que se torna patente o destino dos países atrasados. Açoitados pelo chicote das necessidades materiais e da subjugação ao sistema financeiro global, os países atrasados vêem-se obrigados a avançar através de saltos qualitativos, e apenas quando isso é (ou foi) possivel. Desta lei universal do desenvolvimento desigual (incluindo a componente cultural) deriva-se para outra que, na falta de nome mais adequado, qualificaremos de lei do desenvolvimento combinado, aludindo à aproximação das distintas etapas do caminho e à confluência de fases distintas, numa amálgama de formas arcaicas e modernas. Sem que se tenha em consideração esta lei, inserida, naturalmente, na integridade do seu conteúdo material, seria impossível compreender a história da Rússia ou a de qualquer outro país de avanço cultural atrasado, qualquer que seja seu grau” (4). Esta teoria ou “lei” é o ponto de partida fundamental, a partir do qual, ampliando o seu alcance, visa interpretar o desenvolvimento geral do capitalismo imperialista contemporâneo, fora das visões evolucionistas ou catastrofistas. Ao não partir desta visão dialética os erros unilaterais cometidos por Antonio Negri tornam-se inevitáveis.

(1) Adaptado de Claudia Cinatti (4ª Internacional)
(2) Antonio Negri, “Exílio” 1998
(3) Enzo Rullani, “O Capitalismo Cognitivo: Déjà Vu?”, Revista Multitudes nº 2
(4) Maurício Lazzarato e Antonio Negri, “Trabalho Imaterial e Subjetividade”, em “Futur Antérieur”, 1991
(5) Leon TrotskyHistoria de la Revolución Russa
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