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terça-feira, junho 03, 2008

A defesa da língua de Vasco Graça Moura

foi motivo de queixa no Palácio de Belém

“Com uma celeridade digna de um pistoleiro dos westerns que encantaram a minha adolescência, o meu amigo VGM reagiu a declarações minhas acerca de um estudo sobre internacionalização da Língua Portuguesa (...) como afirmei, neste momento é um pouco uma miragem querer fazer do português uma língua de negócios (...) é óbvio que se pretende decretar que as línguas maternas sejam “bujigangas menores”, enrodilhados no triunfalismo dos que pensam que basta sermos uns 230 milhões de falantes da língua portuguesa para que desde logo ela tenha pujança internacional (...) Confunde-se, pois, uma função da língua com o alargado valor económico que ela pode ter
Professor Carlos Reis, Reitor da Univ. Aberta

Em “Tradições, Princípios e Métodos da Colonização Portuguesa” (1951) o delfim de Salazar (e futuro presidente do Conselho) Marcelo Caetano (especialista no tratamento de línguas na PIDE/DGS) notava: “O interesse dos Portugueses pelos nativos estava expresso desde os primeiros séculos no desejo de lhes levar a mensagem do Evangelho, de os libertar das trevas do paganísmo e salvar as suas almas. Deste modo, os Portugueses viam ao mesmo tempo a possibilidade de tirar proveito das riquezas inexploradas dos novos mundos, de realçar o valor destes países e de oferecer à Europa uma parte das possibilidades inauditas apresentadas por estas regiões tropicais” – era necessário um mínimo de europeização para impor uma ordem social que facultasse a exploração económica. “Os “indígenas” recebiam da “cultura branca” e dos princípios cristãos o suficiente para se tornarem obedientes e disciplinados, mas não o bastante (a técnica e o know-how) para se tornarem hábeis, com um espírito independente e activos” (Eduardo Mondlane, in “Nacionalisme e Développement”, tese apresentada ao “Project Brazil-Portuguese África” da Universidade da Califórnia (1968).

E o Patriarca de Lisboa, Cardeal Cerejeira declarava na sua mensagem de Natal: “Precisamos de escolas em África, mas de escolas onde indiquemos ao nativo o caminho para a dignidade do homem e a glória da Nação que o protege... queremos ensinar os nativos a ler, escrever e contar, mas não fazê-los doutores” – isto é, a língua serviria como factor de dependência e dominação, os mesmos valores que na era do neocolonialismo se querem ver agora transmitidos pela linguagem do consumismo e do marketing. O mesmo que era afirmado em decreto no ano de 1940 por Salazar: “os nativos devem ser gradualmente trazidos da sua condição de selvagens para a vida civilizada”. Como se lia anos depois no programa de cursos editado pelo “Instituto Superior de Ciências Sociais e Politica Ultramarina”: “quando os milhões de portugueses que vivem em África (referia-se aos indígenas colonizados pelo uso da língua) e os outros milhões espalhados pelo mundo fora, falarem, escreverem e trocarem ideias em português, pensarem e sentirem em português, rezarem em português, automaticamente se consolidará a comunidade e a solidariedade espontânea aparece – como o saltar de uma faísca” – e até sobre a resistência armada dos povos das colónias, o discurso não andava muito longe do actual: “O terrorismo a ferro e fogo tem de ser aniquilado pela acção militar, e ela é imprescindível e quer-se fulminante, mas a batalha final, a 100 por cento de rendimento é a batalha pela língua portuguesa. Com esta vitória – a Nação forja a sua melhor arma” (ano lectivo 1965/66)

Como se vê, Vasco Graça Moura, na sua invocação à família, não inventa nada de novo, as suas aspirações puristas no uso da língua como relação de exploração entre colonizadores e colonizados, foi herdada de fonte que ele jamais esqueceu.
Em 1973, um ano antes da queda do fascismo, as verbas inscritas no Plano de Fomento para a maior colónia (Angola) eram distribuidas desta forma: 133 mil contos para o Ensino, 44 mil para a Indústria e 450,7 mil para os Transportes e Comunicações. Como agora, as verbas então dispendidas com o Orçamento Militar (em defesa dos valores da nação) não eram publicadas, conquanto as despesas públicas totais incluindo as forças coloniais atingissem (só para Angola) já perto de 5.000 milhões de contos em 1965. Esta desproporção entre gastos militares e as verbas aplicadas na formação dos portugueses era já então a verdadeira razão do nosso atraso. Já que VGM foi interceder pela língua junto do presidente da república, poderá meter-lhe uma cunha afim de que sejam publicadas as verbas gastas actualmente em Portugal com o Ensino comparando-as com o “budget” (é assim que os yankees dizem?) das Forças Armadas, as nacionais e as envolvidas no “combate ao terrorismo”?
O manual preparatório do IV Plano de Fomento para 1974-1979, que já não foi a tempo de ser aplicado, explica por si a discrepância: “A análise dos dados pouco favorece o sistema: a maioria da população limita-se a frequentar os primeiros anos, abandonando a escola com uma rudimentarissima bagagem de conhecimentos, tão rudimentares que a curto prazo recaem no analfabetismo; e as consequências para a economia são as que advêm de uma quase total improdutividade do investimento que se levou a efeito neste campo”. 34 anos depois a falsa consternação com a ignorância dos portugueses mantêm-se no cínico ar boquiaberto de sua excelência o presidente da República

Revista do Exército, Abril 2008
onde pára o nosso dinheiro? e a resolução da Crise?

Cavaco Silva e George Bush sentados à mesa por interpostas pessoas em Bagdade: o Major General Manuel Correia e o iraquiano Dir Hussein director do NOC - Quem votou a presença destes senhores no Iraque? - segundo consta no texto da Revista do Exército, estão ali "em actividades específicas de job description" (vale a pena ler o texto e as definições da missão)


(os dados citados sobre o Estado Novo e as Colónias foram retirados do livro "O Fim de uma Era, o Colonialismo Português em África" de Eduardo de Sousa Ferreira, Ediç. Sá da Costa (1974)
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