disse Nuno Cardoso da Silva (CADPP): “Os raciocínios baseados em ideologias têm o valor de encantanções e de fórmulas de bruxaria. As ideologias não são uma base válida para argumentar, porque as ideologias não têm valor científico. As ideologias são manifestações de fé, são crenças, transformadas em muletas para mentecaptos. Os axiomas das ciências sociais são valores enquadrados pela ética e pela sociobiologia (...)”
Como podemos distinguir Ideologia de Ciência? a caracterização principal de uma proposição metafisica é nunca poder ser comprovada com factos. Nunca ninguém viu um “ponto” (a partir do qual se constroem linhas e geometrias segundo as necessidades teóricas de cada problema) – o ponto é uma abstração lógica. Num processo similar, também não podemos definir um elefante – mas quando vemos um, sabemos o que é. A ideologia é muito mais parecida com um elefante que um ponto. É algo que existe e podemos descrever, discutir e refutar. Contudo, para resolver discussões, de nada serve apelar para uma discussão lógica: o que necessitamos não são definições, mas sim critérios.Vejamos a seguinte proposição ideológica quando oposta a uma cientifica - “Todos os homens são iguais” – que significa isto de um ponto de vista lógico? A palavra “igual” aplica-se a quantidades. O quê?, terão todos os homens o mesmo peso!? Ou terão idênticos niveis de inteligência? Ou, alargando um pouco o conceito de quantidade, serão todos tipos porreiros? – “Igual” sem dizer a respeito de quê , não passa de um ruído. No que respeita às ideologias passa-se a mesma coisa: há quem negue as ideologias em geral, e em particular que o paradigma do “mercado livre” não comporta uma ideologia, no caso a neoliberal.
No tempo primevo das encantações cinco cegos fizeram uma excursão à India para averiguar o que seria um elefante. Pressentido o bicho todos se precipitaram para ele, estudando-lhe academicamente as partes; Sem ideologia que pudesse atender ao Todo, ao primeiro coube-lhe apalpar a tromba – “deve ser uma cobra gigantesca”, concluiu; Ao segundo uma das patas “é uma árvore de grande porte que anda” disse doutamente; Ao terceiro uma das orelhas – é o “espanador usado pelo sultão”; ao quarto cego, as hastes – “é um rinoceronte duplo, maior que o do D. Manuel”; Ao último por azar coube-lhe averiguar o rabo: “é um engenho de embalar fardos de palha” surpreendeu-se eruditamente o cego.
Se a Ideologia pode ou não ser eliminada do mundo do pensamento nas Ciências Sociais (como o “ponto” da disciplina de Geometria), ela é certamente indispensável no mundo da Acção e da vida social. Uma sociedade com a aspiração de autonomia não pode existir sem que os seus membros tenham sentimentos sobre o que é a maneira adequada de conduzir os seus próprios assuntos. Ou senão resignam-se a aceitar as ideias propostas pela classe dominante. Estes sentimentos comuns exprimem-se em ideologias. Disse Lenine a propósito da batalha das ideias: “sem teoria revolucionária não há Revolução” – ao contrário, no campo conciliador dos mentecaptos do revisionismo da teoria de Marx, dos reformistas (1) e dos neoestruturalistas, pode haver, e há, ideologias “neutras” que negam a luta de classes.
Joan Robinson, 1962: “Do ponto de vista da Evolução, parece plausivel afirmar que a Ideologia é um substituto para o Instinto. Os animais parecem saber o que fazer. Nós temos de ser ensinados. Dado que o padrão de bom comportamento não é transmitido nos genes, é extremamente maleável e toma as mais diversas formas, em sociedades diferentes. Mas (ao contrário da ideologia do individualizado homem lobo do homem) cada animal social necessita de um padrão de moralidade que imponha limites ao seu egoismo natural. Já que os impulsos egoistas são mais fortes do que os altruistas, as exigências dos demais têm de nos ser impostas”.
(1) “Não se pode negar que esses argumentos dos revisionistas se reduziam a um sistema bastante equilibrado de pontos de vista, nomeadamente, o velho e conhecido ponto de vista liberal burguês” (V. I. Lenine, “Marxismo e Revisionismo”)
(2) Banda desenhada "A Invenção da Ideologia" via "Machina Speculatrix"
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