Pesquisar neste blogue

terça-feira, outubro 24, 2006

Fronteiras resedesenhadas, questões redefenidas, religião secularizada



afinal Deus não morreu como disse Nietzsche, foi sequestrado pelo Império norte-americano.

A judia Madeleine Albright discorre em “os Poderosos e o Todo-Poderoso” sobre os Estados Unidos, Deus e o Mundo.
compreende-se:
"o dragão deu-lhe o seu poder, o seu trono, e grande poderio"

Gustave Flaubert morreu em 1880 sem ter concluido “Bouvard et Péchuchet”, o seu romance cómico e enciclopédico sobre a degeneração do conhecimento e a inanidade do esforço humano. Os dois personagens são funcionários e membros da burguesia que, por causa de uma herança de que um deles é beneficiário (alguém disse que a transmissão das heranças é que haveria de matar o sistema capitalista), se retiram da cidade para passar o resto das suas vidas “fazendo o que lhes apetecer”. Fazer o que querem, de acordo com Flaubert, significa para Bouvard e Pécuchet um passeio prático e teórico através da agricultura, da história, da quimica, da educação, da arqueologia e da literatura, sempre com resultados pouco satisfatórios; passam por várias áreas de erudição como viajantes no tempo e no conhecimento, vivendo os desapontamentos, desastres e abandonos de amadores desinspirados. O que eles percorrem, na verdade, é toda a experiência decepcionante dos últimos cem anos, nos quais “os burgueses conquistadores” acabam por ser as vítimas espalhafatosas das suas próprias incompetência e mediocridade niveladoras. Cada entusiasmo acaba por transformar-se num cliché aborrecido, e cada disciplina ou tipo de conhecimento passa da esperança e do poder para a desordem, a ruína e a amargura. Entre os esboços de Flaubert para a conclusão deste panorama de desespero encontram-se dois itens que aqui nos interessam especialmente. Os dois homens discutem o futuro da humanidade. Pécuchet vê “através de um vidro o futuro da humanidade obscuro”, enquanto Bouvard o vê “brilhante!” e diz:
“o homem moderno está a progredir, a Europa será regenerada pela Ásia. Na lei histórica segundo a qual a civilização se desloca de Oriente para Ocidente, as duas formas de humanidade serão por fim soldadas uma à outra”

Para uma pessoa que nunca viu o Oriente, disse Nerval a Gautier, um lótus é sempre um lótus; para mim é apenas uma espécie de cebola

Ora, para se inventar a si próprio e afirmar-se sobre uma amálgama de civilizações e culturas multidiversificadas grosseiramente reunidas sob a noção geral de “Oriente”,como se fossem uma só, o “Ocidente” sempre precisou de “maus": Kaddafi, Nasser, Khomeini, Bin Laden, Saddam... e ontem voltou o mullah Omar. Alguns ajudamos a criá-los, outros convertem-se em homens de Estado e outros são capturados para o espectáculo. A noção de supremacia e de superioridade foi sempre construída no processo de demonização: dos índios, espanhóis, mexicanos, negros, alemães, japoneses, soviéticos, sérvios, latinos, islâmicos, ou seja, de todos os que não são americanizáveis. (ver: Estados Unidos: Imperialismo e Guerra – uma Resenha Histórica)

Hello! I`m back!
Este tipo de pensamento prolonga-se pelas atitudes típicas do que viria a seguir, e por extensão ao que vem a seguir agora, por isso a actualidade das figuras que Flaubert satiriza. A noção de “regeneração” leva-nos, portanto e citando, de volta a:

“(...) depois de uma conspicua tendência romântica, após o racionalismo e o decoro do Iluminismo(...) voltamos ao drama absoluto e aos mistérios supra- racionais da história e das doutrinas cristãs e aos violentos conflitos e abruptas reviravoltas da vida interior cristã, voltando-se para os extremos de destruição e de criação, inferno e céu, exílio e reunião, morte e renascimento, tristeza e alegria, paraiso perdido e paraiso reconquistado. (...) Mas, visto que viviam, impreterivelmente, depois do Iluminismo, os românticos reviveram estas antigas questões com uma diferença: encarregaram-se de preservar a visão geral da história e do destino humanos, os paradigmas existenciais e os valores fundamentais da sua herança religiosa, reconstituindo-os de modo a torná-los aceitáveis do ponto de vista intelectual, bem como pertinentes do ponto de vista emocional, por enquanto”.

Flaubert, claro está, faz com que os seus pobres tolos se confrontem com estas dificuldades. Bouvard e Pécuchet aprendem por fim que é melhor não traficar simultaneamente ideias e realidade. A conclusão do romance é a imagem das duas personagens perfeitamente satisfeitas a copiar fielmente as suas ideias favoritas do livro para o papel. O conhecimento deixa de ter de se aplicar à realidade; conhecimento é aquilo que é passado silenciosamente, sem comentários de um texto para outro. As ideias são difundidas e disseminadas anonimamente, repetidas sem atribuição; tornaram-se, literalmente, idées reçues; o que é importante é que estejam lá, para serem repetidas, ecoadas e re-ecoadas acríticamente. Contudo, apesar do esforço dos neocons

De seguida, veremos como actualmente “o Ocidente se regenera” pela via Asiática – mormente pela re-invenção de uma Economia que vive, como sempre do mesmo sistema de trocas desiguais, e da importação de mercadorias fundadas sobre o trabalho escravo.
(continua)

Sem comentários: