Gore Vidal e John F.Kennedy
Foi um norte americano tranquilo, culto e traquinas, o que é uma raridade; dos poucos que pensava ser possível fazer valer posições imperialistas sem as relacionar com instrumentalização politica,corrupção, ignorância e agressão. Não compreendendo, ou deliberadamente branqueando a natureza de centro multinacional de captação do melhor que existe em intelligentsia no mundo, Vidal dizia da “sua gente”: aqui nos Estados Unidos “cinquenta por cento das pessoas não votam, e cinquenta por cento não lêem jornais. Espero bem que sejam as mesmas cinquenta por cento.” Familiar próximo de Jackie Kennedy tornou-se amigo pessoal de John Fitzgerald Kennedy, relacionamento do qual disse na época: “é sempre um assunto delicado… quando um amigo ou pessoas que nos são próximas chegam à presidência” (tinha mantido igualmente relações de amizade próxima com Eleanor Roosevelt e com a princesa Margarida de Inglaterra, descritas nas suas memórias “Palimpsesto” e na sequela "Ponto de Navegação (2006). Polemista mediático nos seus tempos áureos (“Nunca perco a possibilidade de fazer sexo e de aparecer na TV”, dizia) Vidal, depois do assassinato de Kennedy desencantou-se com a sua “América” (“Quanto mais dinheiro acumula um americano, menos interessante se torna”) e exilou-se durante décadas em Itália, na paradisíaca vila de Ravello na Costa Amalfitana.
na varanda da casa de Ravello
É aqui que escreve a obra pela qual merece ficar literariamente imortalizado – a Criação (1981). História romanceada ou romance histórico, é um épico protagonizado pelo diplomata da Pérsia Aqueménida que viveu no século V antes da nossa Era, Ciro Spitama neto de Zoroastro que viajou incessantemente para conhecer o mundo, comparando as crenças religiosas e os sistemas políticos das várias nações do seu tempo. No decurso da sua vida Ciro conhece muitas figuras influentes filosoficamente, incluindo o seu avô (fundador do Zoroastrismo), Sócrates, Buda, Mahavira, Lao Tsu e Confúcio. Na prática, a obra é um monumental e ambicioso fresco em que se comparam dramaticamente os sistemas políticos e religiosos de então com os que vigoram nos nossos sistemas contemporâneos. “O grande diabo que nunca é mencionado na nossa cultura é o Monoteismo. Do texto supostamente inventado na bárbara Idade do Bronze, conhecido como “antigo testamento” evoluíram três religiões – cristianismo, judaísmo e islamismo. Todas as três são religiões que situam Deus no Céu. São literalmente patriarcais – Deus é o Pai Omnipotente – o que tem sido muito útil para aterrorizar as mulheres por 2000 anos naqueles países que são dominados pelo Deus do Céu e pelos seus Delegados, todos machos terráqueos. O deus-no-Céu é naturalmente um deus invejoso (pela relação entre causa e efeito, “a inveja é (também) um factor central da vida americana”). Ele (Deus) requer total obediência para toda a gente na Terra, na medida em que ele está à frente não apenas de uma tribo, mas de todos os gentios de sua criação. Todos aqueles que o rejeitam devem ser convertidos ou mortos para o seu próprio bem. Como corolário último, o Totalitarismo é a única forma politica que pode servir verdadeiramente os propósitos do deus-do-Céu – Levando os crentes a acreditar na existência do bem no Céu, mas espalhando e assistindo impávida e serenamente à desgraça apocalíptica na Terra, “Deus” de facto é um chantagista”.
Vidal pensava assim as religiões, mas escreveu o argumento repleto de milagres pró-sionistas do épico hollywoodesco Ben-Hur. Culminando com filosofias bem mais comerciais a bem da manutenção da villa italiana e outras dispendiosas famas,, Gore Vidal apareceu num dos episódios dos Simpsons – no qual Lisa, com um livro em punho (“estes são os nossos únicos amigos”) declama: “Cresçam seus Nerds, como fez Gore Vidal – ele já beijou mais rapazes do que eu alguma vez beijarei em toda a minha vida” – “raparigas, Lisa, raparigas” corrigiu erradamente a mãe Marge Simpson
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