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segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Para um debate da Televisão de qualidade no Espaço Público

Quem manda nos que mandam em nós?

Em finais do ano passado, o senhor Nuno Santos, ex-Sub-Director de Programas do Canal Público de Televisão (RTP), viajou para Itália, e foi recebido em Roma pelo Papa. Em matéria de ocupação de um espaço que é pago por um imposto especial cobrado em nome de uma prestação de serviços no Audiovisual que se pretenderia isenta e que não ofendesse susceptibilidades por razões religiosas, como (bem) determina a Constituição Portuguesa, do que ficou então decidido ninguém soube. Até ontem!, exaustivamente, horas a fio em directo na TV. Como em matéria de multidões orquestradas não quero acreditar no que os meus olhos vêem, socorri-me do Diário Ateísta para ver o que estava a acontecer. Afinal, em nome da Fé, era só mais um crime. Nada de grave:

“Por iniciativa da Santa Madre Igreja e, não fosse o Diabo tecê-las, sob forte escolta policial (obviamente paga pelo Estado), e ainda com a complacência do Ministério Público, o cadáver de Maria Lúcia de Jesus e do Imaculado Coração de Maria foi hoje profanado, infringindo-se assim o Código Penal Português cujo Artigo 254º crime que é passível de ser punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias”. Mas lá que há Bruxas há. O certo é que alguem irado com a ilegalidade determinou que chovesse a potes e relampiscásse com violência durante todo o santo dia.

Também eu, não sendo Director de Programas de Coisa Alguma gosto de visitar Itália, sr. Director (embora a minhas expensas, caro Nuno Santos). De lá procedem muitas das heranças culturais da Europa do Sul atrasada, vítima precisamente da estúpida crendice religiosa servida a contragosto, imposta por métodos terroristas.
Caminho por uma rua estreita (todas são estreitas) para chegar à Piazza Duomo, onde a catedral de Santa Maria Asssunta domina a paisagem. Ao lado, o Palazzo Episcopale. Reparem naquela sombra no meio da torre da Igreja:




Na realidade é uma cela, onde eram colocados os presos mais rebeldes, por ocasião da visita de alguma Autoridade. O preso ficava exposto naquela gaiola, morria, apodrecia e os seus ossos só podiam ser recolhidos após caírem no telhado e rolarem para o chão.
Por perto,
a Igreja de Santa Maria di Campagna de onde partiu a Primeira Cruzada Cristã de conquista de terras aos Muçulmanos.


Da mesma época, tambem de Itália, nos chegou outra herança (in “El largo siglo XX”, Giovanni Arrighi)

O capitalismo começou no Mediterraneo europeu, no norte de Itália, centrado nas cidades portuárias que tinham vínculos com o Oriente. Este capitalismo mediterrânico era basicamente comercial. A todo este período chama Arrighi o “ciclo de capitalismo genovês” devido ao seu papel expansivo que põe em jogo o capital dos empresários de Génova. Esta expansão produz-se entre o século XIV e o século XV. Este tipo de capitalismo distingue-se dos outros circuitos de capital (como o Milanês,Veneziano e Florentino que se tinham inclinado para investimentos na construção de Estado, desenvolvendo estratégias e estruturas rígidas de acumulação de capital), preferindo o modelo de construção de mercados embarcando em estratégias e estruturas cada vez mais flexíveis de acumulação. Na história do Capitalismo, Arrighi reconhece quatro grandes ciclos de capital, quatro ciclos sistémicos, cada um deles definido por uma unidade fundamental de acumulação primária e pelas estruturas e processos de acumulação de capital à escala mundial – 1 ciclo Genovês que se estendeu desde o séc.XV até princípios do sec.XVII – 1 cicloHolandês, que durou desde fins do sec.XVI até finais do sec.XVIII – 1 ciclo Britânico que abarcou a segunda metade do sec.XVIII até aos primeiros anos do sec.XX – e um ciclo Americano que começou em finais do sec.XIX com a invasão de Cuba e que continuou até à fase actual de expansão Financeira.

No final desta breve digressão pela história católica, eis como, daqueles que ocupam o espaço público, ontem como hoje em conluios secretos com o Poder, não se ouvem quaisquer esforços na condenação dos crimes que são hoje, como foram ontem, cometidos. Apenas ladaínhas catoliçóides. Esta do turismo funerário do cadáver da santa foi demais. Um dia destes com a beatificação haverá mais. A malta sóbria passa-se dos carretos.

Grand Tour, os maus vícios aprendem-se depressa

Durante todo o século XVIII a Europa do Norte descobriu o Renascimento italiano. Gerou-se nessa época um grande movimento de romagem cultural dos nobres, artistas e filósofos de todas as Côrtes europeias no sentido de apreenderam as obras de arte que de forma verdadeiramente surpreendente para as tribos guerreiras cristãs do norte, tinham sido possiveis na sequência da Inquisição. Esse movimento de peregrinos culturais ficou conhecido como o "Grand Tour".Não foi decerto apenas Arte que esses viajantes levaram de volta na bagagem.


"John Bargrave rodeado por Alexander Chapman e John Raymond estudam o mapa de Itália".
Óleo sobre cobre, da autoria de Matteo Bolognini,1647.
Catedral de Canterbury, Inglaterra.

* Para aprofundar o tema - Religião e Poder:
"O Dicionário da Heresia, e dos Dissidentes"

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