DEZ RÉIS DE ESPERANÇA
Se não fosse esta certeza
que não sei de onde me vem,
não comia, não dormia,
nem falava com ninguém.
Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos à boca
e viesse o que viesse.
Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas
a cair impertinente,
aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,
não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,
essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,
se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.
António Gedeão
* Cronologia do golpe militar de 25 de Novembro de 1975, aqui.
* a subida ao Poder de um obscuro capitão que tinha chumbado no exame da 4ª classe - a ler aqui, na Wikipedia
* a versão dos acontecimentos relatada por Álvaro Cunhal, aqui.
* que restará da Constituição de 25 Abril redigida pela Assembleia Constituinte eleita pelo povo em 1976, e revista em 1982, 1989, 1992, 1997, 2001 e 2004?
* o autor da "biblia do PREC"
* Bibliografia
* Otelo Saraiva de Carvalho, um homem da noite lisboeta, em Cuba
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