Pois sim. Mas o que lêem as pessoas? Numa lista dos 10 mais vendidos na feira, temos: 1 romance terrorista de meter medo para acagaçar vítimas de literatura danbrown mas escrito em dialecto nacional pelo locutor de televisão 6AYHAS1HA8RU, sob o mote “e se a Al-Qaeda (uma coisa que nem sequer existe) tiver a Bomba Atómica? – todo o leitor revolucionário que passa actualmente por insurrecto há-de querer uma, mais não fosse para derreter rodrigues-dos-santos para fora do espaço público. Mas, num processo tecnológico altamente complexo e secretivo, onde se poderá dirigir o comum dos mortais para obter tão sofisticados materiais nucleares? - a Israel certamente, mas o autor da novelesca rábula editorial não menciona essa fonte.
No top racista “Fúria Divina” foi a treta que mais vendeu para as crianças grandes, depois da colecção para crianças pequenas “Aprende com o Professor Girassol”. Nos restantes títulos, temos: uma estrela de música-pop-Disney, um outro livrito com 69 contos sobre Sexo; um sobre “Empreendorismo e Inovação”, respigado do discurso oficial para a garotada adolescente (temos mercado porque “35% dos portugueses sonham ser patrões deles próprios” (1); passando por alguns outros de banda desenhada, até chegarmos finalmente ao primeiro livro, o 10º em vendas, escrito por alguém honesto: Júlio Cortázar, com o “Jogo do Mundo”. A preclara editora Leya gaba-se de ter vendido mais de 100 mil livros nesta feira. Depois de ter destruido recentemente milhares, colocou agora alguns remanescentes impróprios para o mercado em bancas de refugo para venda ao desbarato. Entre eles estava a melhor edição portuguesa de sempre do “Rei Lear” traduzido e anotado por Álvaro Cunhal (Caminho, 2002)
Biblioteca Itinerante
- óh sr. Silva mostre-me lá que livro é que leva aí escondido- ora, para que é que quer ver? A menina nem sabe ler
- e qué quisso interessa? Posso ver os bonecos…
- prontes, tome lá, é o Kamasutra
- pensei que tinha dito Brecht, que me soa assim a coisa partida
- ou Shakespeare
- santinho !!
- ...
(1) Segundo um estudo da Kelly Services, uma multinacional de “recursos humanos” (em termos clássicos: mão-de-obra assalariada à peça), “35 por cento dos portugueses gostavam de ser patrões de si próprios e olham com mais atenção para essa possibilidade nesta altura de crise” (fonte)
1 comentário:
Costumo entrar na Bulhosa – tirando os livros técnicos e duas dúzias de romances, tudo o resto é merda e propaganda.
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