Na década de 90 os académicos norte americanos Chris Langton, Murray-Gell-Mann, James Gleick (1), entre outros, reuniram-se em torno do ensaio “Complexity, Life on the Edge of Chaos”.
Partindo do princípio que o Macrocosmos, para a nossa dimensão e estádio de compreensão actual, é completamente ordenado, e que o Microscosmo se verifica ser totalmente aleatório, o grupo concluiu que, interagindo entre os dois extremos, algures a meio, se situa um estádio de complexidade e equilibrio que permite a Vida. Só se podem compreender os sistemas complexos usando computadores sofisticados, porque eles podem ser altamente não lineares (conferindo complexidade à teoria da evolução), estando portanto para além da física clássica na análise matemática-padrão. A tese é suportada pelo facto da maior parte da Natureza ser constituída por sistemas dinâmicos não-Lineares.Da interacção dos componentes do sistema onde o individuo se movimenta emerge uma espécie de propriedade que abrange a sua totalidade como uma estrutura emergente; qualquer coisa que não poderia ser previsto a partir daquilo que sabemos das partes componentes. Esta “vontade própria de um sistema”, organizada em si e invisível, sem necessidade da organização de indivíduos organizados, é como se fosse guiada, de novo, pela famigerada “mão invisível”, a mesma que fundamentou a economia capitalista moderna e os mercados financeiros ultraliberais.
Na evolução biológica, a experiência do passado está comprimida na mensagem genética codificada no ADN. No caso das sociedades humanas, os componentes esquemáticos são as instituições, os costumes, as tradições e os arquétipos das mitologias. Este agregado é, com efeito, uma espécie de ADN cultural. Interagindo com o ambiente, indivíduos e sistema “aprendem” com a experiência e como resultado adaptam-se aos novos padrões do paradigma emergente. Aquilo a que os matemáticos chamam atractores, estados em que os sistemas acabam por assentar por fim, dependendo das propriedades do próprio sistema. Agentes distractores que “pensem” fazer uma revolução munidos apenas de uma causa, esqueçam. Ou então lembrem-se – a História está repleta de exemplos de grupos sociais que atingem altos níveis de auto-organização e depois colapsam – caos instalando-se ocaos por longos períodos de êxtase, pontuados aqui e ali por períodos de mudança brusca à procura de uma nova Ordem com tendência resiliente de manter a maior parte da desordem anterior.
Munidos da filosofia conjugada do Principio da Computação Universal (A Máquina de Turing (2) e da Dinâmica dos Autómatos Celulares de Von Neumann (a baixa velocidade temos um fluxo de informação regular, a alta velocidade temos turbulência), os nossos académicos do Instituto de Santa Fé concluíram que a chave-base na organização da vida estava na quantidade de informação e na velocidade a que esta se processa. tentam manipular o “jogo da vida”, isto é, introduzindo grupos de algoritmos em computadores, verifica-se que estes interagem entre si gerando novas sequências, ora avançando numa infinidade de padrões, ora desconstruindo-se quase até ao colapso. Verifica-se que pequenas cascatas de mudanças desencadeiam completas avalanches, equivalentes a extinções em massa, mas mantendo sempre a capacidade do sistema para se regenerar. É isto a criatividade da Evolução ad infinitum?
Conciliar as leis mecanicistas de Newton com a ciência da Termodinâmica
Contem o número de células do organismo, e depois as funções especializadas que todos os organismo podem desempenhar. Temos processamento de informação no seio dos organismos, dentro das células dos organismos e dentro de redes de unidades constituídas por muitos organismos; a Consciência é aqui o maior enigma, que emerge desse quilograma de matéria cinzenta húmida chamada cérebro, um pequeno computador pessoal não confiável que pode ser programado a partir de falsidades, ou de ideias apropriadas. A computação é mente.
o Progresso, na velha ordem apenas linear é uma ideia nociva culturalmente encrustada, impossível de avaliar e de grandeza não operativa, que deve ser substituída. O climax de uma espécie em progresso é o processamento de dados e informação. Da reformulação da teoria de Darwin, traz-se estabilidade do nivel inferior para o nivel superior na hierarquia bio-ecológica, culminando na Gaia-Ciência. Phil Anderson, um defensor da tese da Gaia, a deusa Terra como um super-organismo que mantém o equilíbrio global, acredita que os indivíduos como especimens de um grupo actuam num modo estreito, darwiniano e egoísta, de tal sorte que farão batota em prol de um ganho próprio, mas um eco-sistema chega a um estado colectivamente benéfico, se estiver controlado através de vastas redes de interações onde se insere. Per Bak, autor da teoria da “Criticalidade Auto-Organizada” nota que um único algarismo pode perturbar o sistema. Se um novo grão-de-areia provocar nova perturbação, a espécie é deformada a partir do exterior, tornando-se menos adequada. E novas espécies vão substituir as existentes. A seguir ao homem humanista, mascarado de super-homem, surge o homem sem qualidades. Stephen Jay Gould, advoga em ”A Wonderful Life” ser o mundo em que habitamos simplesmente um de uma virtual infinidade de mundos. Durante vastos períodos de tempos mortos o mundo fervilhou de criaturas vivas, perecendo uns, evoluindo outros. A sobrevivência exige computação, ou seja uma optimização no limiar do Caos.
A emergência de uma tendência inexorável para um cada vez maior processamento de informação na Natureza, se for verdadeira, sugere que a evolução de uma inteligência suficientemente poderosa para contemplar tudo isto é inevitável. A história, situada no futuro , é a descoberta de um super-computador tão potente que dirigiria eficazmente os assuntos de Estado e das Comunidades; recheada com 10 elevado a 17 “unidades lógicas” qualquer máquina superaria qualquer aglomerado de comités centrais de cérebros humanos… No momento da apresentação de tal revelação – The Emperor`s New Mind, o modelo computacional da Consciência (3) – os nossos académicos e projectistas fazem-no frente a uma jovem plateia de interessados. Alguém pede a palavra e pergunta: “Então e o que é que essa coisa sente?” – o áparte terminou com uma bela gargalhada geral e a ideia do “The Computational Global Brain” foi esquecida. Estamos perto da ideia divina, ou de nova crendice new age?
A supercoisa pareceu esquecida, mas alguém a relembrou: os operadores das bolsas de valores, primeiro com a adaptação da “teoria do Caos no limiar do mundo dos negócios” (4), e logo após com os “Principles of Scientific Management”. Nas economias há decisões conscientes tomadas por indivíduos, enquanto em biologia não há intenção consciente desse género. É impossível pré-determinar numa ordem o que acontecerá na realidade, mas os agentes que actuam sobre o sistema podem dar ordens num sentido direccional em que, mais tarde ou mais cedo, o resultado a obter irá emergir. Como habitualmente o Lucro. A negociação electrónica de alta frequência HTF permite relançar o Valor (5) possibilitando-lhe uma maior quantidade de transações em simultâneo, conferindo mais velocidade às ordens de compra e venda no mercado, isto é, fazendo dinheiro numa arbitragem invisível ao olho humano, medindo os movimentos de preço ao milésimo de segundo, em porções quânticas conhecidas na gíria por ticks (são moedas em bytes, por analogia com a febre da carraça: tick). No começo do século XXI esse tipo de operações requeriam um periodo de execução de vários segundos, mas cerca de 2010 esse tempo tinha diminuido até aos milisegundos, inclusivamente aos microssegundos.
Neste caso e depois do crash real de 2008 os investidores adoptaram a negociação algorítmica à Bolsa, livre da falibilidade, indolência e comando frenético dos operadores humanos. O sistema HFT (High-Frequency Trading) é uma plataforma que usa uma rede de poderosos computadores que permitem um maior número de ordens de compra e venda de acções a velocidades elevadíssimas. Assentes em bases de algoritmos complexos, estas analisam os múltiplos mercados e executam por si mesmas ordens quase em tempo real, baseando-se nas condições de mercado. Tipicamente os traders electrónicos com maior capacidade de acção obtêm maiores lucros que os operadores com menor capacidade de execução. Quanto mais velocidade melhor se especula (6). Tratava-se de um tipo de negociação nos mercados financeiros que se tinha mantido escassamente conhecida fora do sector financeiro desde a sua criação, aparecendo pela primeira vez de modo generalizado em Julho de 2009. Embora a entidade reguladora (7) dos Estados Unidos a tivesse já autorizado desde 1998.
O que defrontamos hoje, portanto, é um sistema de máquinas em que vemos o declínio da capacidade humana para influenciar os movimentos de preços em escalas de tempo cada vez mais pequenas (8). Mas entregue a uma superinteligência artificial nem tudo o que sai dali é racional. Perto do tal limiar do caos os mercados ficam cada vez mais sensíveis a efeitos desestabilizadores externos aos computadores (hellas, de novo os humanos) e o risco sistémico aumenta. A primeira amostra de surpresas desagradáveis proveniente da volatibilidade insana das HFT ocorreram na bolsa norte-americana em 2010 no que ficou conhecido como “derrocada instantânea” (flash crash). A primeira deu-se a 6 de Maio e terá havido outra a 1 de Setembro, cujas causas não foram investigadas (daria para investigar máquinas?). Todo o mundo acompanhou com estupefacção e quase em directo o colapso durante os trinta minutos que decorreu. O índice Dow Jones Industrial caiu 998,5 pontos, a mais colossal quebra jamais registada, levando à evaporação de quase um bilião de dólares de capitalização, para de seguida recuperar meteoricamente com a segunda maior subida da sua história de 1.010,14 pontos. Na gestão diária tornou-se frequente os colapsos de futuros HFT em 5 pontos percentuais em 15 minutos (9). Esta semana a revista Visão relata numa breve nota um novo colapso relâmpago do mercado de Bitcoins (mas engana-se quando afirma ter sido o primeiro). Portanto o jogo do casino financeiro ainda não acabou. Convém andar com cuidado (10). Decerto Vc não quer ser apanhado com um saco cheio de Moedas em Bytes quando esta nova dança parar.
notas:
(1) James Gleick, “A Teoria do Caos”, 1987
(2) John Conway, "The Game of Life"
(3) A Nova Mente Imperial
(4) Roger Lewin e Birute Regine
(5) One Market Data
(6) “The Great Bargain or a Bridge to Nowhere” (ATMonitor)
(7) em 2003, o sistema em rede de máquinas computacionais representava apenas 5% em volume de ordens de compra e venda em bolsa; De acordo com o indice NYSE, a negociação de alta frequência entre 2005 e 2009 cresceu cerca de 164% - ou seja, em menos de dez anos cresceu treze vezes! Em 2010 era estimado que mais de 50% do volume de transacções em Bolsa provinham de ordens de alta frequência. E o sistema domina hoje perto de 90% das negociações em Bolsa.
(8) Securities and Exchange Commission of United States (SEC)
(9) “a 5ª Revolução Financeira” - Os algoritmos que conquistaram Wall Street, capitulo 10, in “Como o Capital Financeiro Conquistou o Mundo, de Jorge Nascimento Rodrigues, 2012.
(10) Cuidado. Se houver voluntários para averiguar como esta coisa funciona em concreto e mais detalhadamente, as suas cabeças podem explodir. “Bitcoin: Currency Revolution or Bubblicious Fad?” (para ler na Alternet)
.
Uma simples mistificação dos economistas da escola neoliberal norte-americana, fazendo tábua rasa da distinção entre o Valor de Uso e o Valor de Troca das mercadorias de Karl Marx em “O Capital” moldou o mundo do pós-guerra tal e qual o conhecemos. Neste sentido, só o Presente é nosso, não o momento passado nem aquele que aguardamos, porque um está destruido, e do outro, se não lutarmos, não sabemos se existirá.
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segunda-feira, abril 22, 2013
a Vida Própria e Complexa das Bitcoins (as Moedas em Bytes Electrónicos)
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