“A palavra ainda nos pode resgatar a todos”
Arundahti Roy
9 em cada 10 portugueses não lêem.
e os que lêem, lêem o quê? – a avaliar pela maioria do que se vê nas listas dos top de vendas, lêm merda.
Mandam as boas regras que se deve ler; ler para se conhecer, aprender,,, para se ser culto, presume-se. Então, devemos ler o quê? – se fizermos fé no mercado e seguíssemos as ofertas mais apelativas, apresentadas cuidadosamente embrulhadas no marketing de avultados investimentos, breve teríamos a carola literalmente atafulhada de margaridices, ritices, dansBrownszadas e outros especiméns de literatura light “de grande êxito” de venda em supermercados a preços de saldo. Grandes quantidades de exemplares vendidos a baixo preço geram lucros fabulosos para as máquinas editoriais, ao mesmo tempo que se cumpre o objectivo nacional das elites, que é tão simples como promover, financiando, a manutenção do estado geral de estupidificação das pobres massas de alarves. É possível adquirir um calhamaço de 552 páginas da autoria de um locutor de Tv por 22 euros (Editora Gradiva), ou uma biografia americana (!) de Mao por 30 euros com 866 páginas!. No outro lado do espectro, obviamente o lado bom, um pequeno opúsculo que edita o discurso “Arte, Verdade e Politica” do prémio Nobel deste ano, Harold Pinter, com apenas 52 páginas custa 9 euros (Editora Dinossauro). Uma colectânea de poemas de Pasolini (Editora Assírio&Alvim) custa 20 euros. O “Código da Vinci”, 450 paginas custa 14 euros. Estamos a falar de censura institucional por via administrativa empresarial?
Mas há mais formas de intervenção,alem do preço, cerceando, com a finalidade de desacreditar, o uso da palavra escrita.
O “Financial Times”, um barómetro infalível, e bem apetrechado filosoficamente, na avaliação da qualidade do que se edita no campo da Literatura universal, tem uma opinião desfavorável sobre José Saramago. A critica literária do jornal despacha o livro “Ensaio sobre a Lucidez” (“Seeing”, na versão inglesa agora traduzida) com um seco “decididamente frustrante como ficção”, ao mesmo tempo que enleva a tradutora Margaret Jull dizendo que ela fez “um trabalho notável tornando claro, preciso e legível um texto palavroso e enrolado". Sem dúvida, um tratamento eficaz, para uma obra que custa 10 euros.
António de Sousa, Pintura Mural, 2006:
Na recente tentativa de proibir a edição do livro “Couves&Alforrecas” (55 páginas, 8,5 euros), uma critica à escrita subliterária de MargarinaRebeloPinto, que se encobre sob o manto diáfano do auto-plágio, o Tribunal decidiu não dar provimento à providência cautelar que impediria a sua publicação. Mas, na decisão final, a juíza arrogou-se a comentar a sua opinião (ou a do Tribunal?) salientando que o “texto completo da obra de João Pedro George “se contém genericamente dentro da crítica objectiva, embora salpicado por expressões que, para alem de incorrectas e indelicadas, são susceptíveis de se revelarem ofensivas dos direitos do bom nome, honra e consideração da escritora”. Por esta altura do texto, para satisfazer egos com vícios de leitura “à esquerda” cumpre-me enfiar aqui uma caralhada em homenagem ao Luiz Pacheco,,, - senhora doutora Juíza! – quem habilitou vossa Senhoria para tecer juízos de valor sobre o bom nome de trampa?,,, não caberá aos leitores essa tarefa?
É uma vergonha que um tribunal, num país livre, aceite julgar casos destes.
que relação existe de facto actualmente entre a Arte, a Verdade e a Politica?
que o economicismo neoliberal não tenha corrompido?
"O Tempo encobre a Verdade"
Giambattista Tiepolo - Palazzo Sandi - Veneza
“Como escritores tentamos integrar este mundo desintegrado. Encontramo-nos entre a esperança pessoal e a desesperança pública. Na situação em que o mundo está, estamos a escrever de uma zona de guerra. É impossível regressar a casa, ao nosso escritório”
Eduardo Galeano
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