o documentário de Murray Lerner filmado ao vivo na época que evoca a lendária actuação foi visto ontem à meia noite no Indie Lisboa. Naquele ano mais de meio milhão de jovens ocidentais de classe média a atirar para o rebelde possuidos por uma ilusão indómita de que iriam mudar o mundo juntaram-se numa ilha inóspita do sul da Grâ-Bretanha para o fazer através da música. Estiveram presentes Joan Baez, Jimi Hendrix, os Pink Floyd e muitos outros futuros icones comerciais de massas; Vimos agora ao longe que estes mega-eventos, onde não existe uma direcção politica centralizada nem objectivos concretos para além de meros e inúteis protestos de circunstância...
... derivam sempre no mínimo em três coisas: arame farpado para quem não paga bilhete, enorme confusão no acesso (Cohen teve de lutar tanto a abrir caminho para chegar à ilha que rotelou a sua banda com o nome de "The Army") e muito, muitissimo lixo - e eis que chega à sala Durão Barroso acompanhado por um casal de chavalos para assistir à sessão. Choque e Espanto. Ali estava ele, anónimo, para embasbacanço geral, sem qualquer segurança no meio da sala repleta de potenciais terroristas. Acreditará a patusca personagem ela própria no papel que anda a representar? - a propósito, naquela época (1970) a maioria da juventude portuguesa enfiada nas matas da guerra colonial nada viu de festivais, este, Woodstock ou até da ida dos cowboys à Lua. Pelo contrário, ao agora Presidente da Comissão Europeia deve ter-lhe sabido bem o revivalismo da época em que andava a roubar cadeiras e mesas na universidade...
os homens entregues a tutela pública
esquecidos como Hassidim
que acreditam que são outros.
Bravo! Abelardo, viva! Rockefeller,
toma estes bolos, Napoleão,
hurrah! duquesa atraiçoada.
Longa vida masturbadores crónicos!
monoteístas!
familiares do Absoluto
chupando em círculos!
Sois todo o meu consolo
enquanto me volto para enfrentar a colmeia
enquanto desgraço o meu estilo
enquanto embruteço a minha natureza
enquanto invento piadas
enquanto puxo as minhas jarreteiras
enquanto aceito responsabilidade
Consolais-me
incorrigiveis traidores do ego
enquanto saúdo a moda
e convenço a minha mente
como uma hospedeira de bordo promíscua
repartindo pára-quedas numa queda a pico
convenço a minha mente despedaçada
a examinar os factos.
(Leonard Cohen, Poemas e Canções, Volume I, 1999)
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