a Sony Pictures Television International Networks Ibéria (passe a publicidade) tratou de tudo. Que a mini-série mais cara de sempre, que custou 146,3 milhões de euros, fosse exibida em Portugal imediatamente dois dias após a sua estreia no canal norte-americano HBO. A intenção de juntar financiarização audiovisual, tecnologia e arte na mesma omelete não tem nada a ver com verdade. O objectivo nestes entusiásticos festivais bélicos é, como notou Cintra Torres, “a de nos conseguir tornar cúmplices das narrativas (imperialistas) e com elas, da História dos EUA”, ou seja aceitamos (quem aceita) o intensivo patriotismo audiovisual yankee e o conceito de “guerra justa” como natural, “como se fosse coisa nossa”.
A estória em si versa os temas habituais. Começa com uma mentira, o ataque a Pearl Harbour que ditou a entrada dos EUA na IIGGuerra. Como é sabido, o incidente com os japoneses foi fabricado e consentido por Roosevelt, um presidente emaranhado na recuperação económica da crise para cuja resolução precisava criar um motor de expansão: a guerra. O primeiro episódio recorda a terrifica disputa pela ilha de Guadalcanal, para onde os generais ordenaram a largada de vários batalhões de soldados pouco mais que entregues à sua própria sorte (pudicamente Spielberg ignora os episódios de canibalismo entre soldados americanos). No resto, a série de que se exibe hoje no AXN o 4º episódio, segue os trâmites normais das telenovelas informatizadas por grandes orçamentos ao gosto do maralhal. Depois do inferno as tropas fazem a rotação para a rectaguarda, a Imprensa faz dos sobreviventes “Heróis Nacionais” e estes papam uma miúdas nativas na Austrália e as miúdas vice versa lambem-se com uns quantos salvadores da pátria à pala da aura de heroísmo. Mas a boa vida não dura para sempre, hoje volta a haver mais porrada da boa, da ideológica. Abriguem-se!
Voltando ao colonialismo cultural observado por Eduardo Cintra Torres: “Não houve em 50 anos de TV em Portugal um único programa ficcional sobre as guerras medievais e seus episódios de grande potencial narrativo, como a guerra contra Castela depois de 1383. Nada se fez sobre as guerras da Restauração ou as guerras europeias em que Portugal participou na Idade Moderna. Nada sobre as guerras internas da Idade Média ou a Guerra Civil de 1826-34, que confirmou o Portugal contemporâneo (mas sabemos imenso sobre a guerra civil americana). Nenhum drama sobre as guerras de controle do mar e de territórios no Atlântico, no Índico e até no Pacífico. Nunca se ficcionou a participação de Portugal na Grande Guerra. À excepção de um telefilme na SIC, a Guerra Colonial não gerou ficção televisiva, apesar de haver ampla criação literária na matéria. Não temos o serviço público certo”.
Por uma questão de orçamento para a cultura (1 por cento do PIB). Então não seria tão salutar, por exemplo, ver uma série sobre a forma exemplar como o nosso João II limpou o sebo aos fidalgos que engordavam alarvemente no Reino, alguns pelas suas próprias mãos? Apesar, et pour cause, desse crime fundacional El-Rei foi cognominado “o Príncipe Perfeito”!, porque ao promulgar a purga, colocou a nação no caminho da grande epopeia portuguesa. Mediaticamente inconveniente, decerto, mas isto é que nos parece ser Pacifico
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