Quem hoje sacar a folha que capeia o Público do resto do pasquim e a escancarar de par em par,
vis a vis a pagina 2 com a 47, tem duas surpresas – à esquerda, uma jovem que protesta, a propósito do espólio sacado através dos combustíveis, contra os “ladrões de auto-estradas” e mesmo ao lado o famigerado Barroso, que escreve uma redacção sobre um obscuro “intelectual que todos deveríamos apreciar no debate civilizado de ideias”.
Não se faz a mínima de quem seja esse de tal Carlos Espada, o elegiado, mas para o ser pelo Barroso, que esse sim, conhecemos de gingeira como “puppy intelectual bushista”, é porque o homem de certeza não presta. Cheira-me que seja um desses obcuros portugueses que se notabilizam no guiness por enfardar não sei quantas catadupas de pastéis de nata à borla pagos pela confraria de Belém, mas como no concurso do Malato, não estou certo.
Olha que dois. Para conferir alguma credibilidade à subida ao mesmo limbo scolariano “da figura pública” retrata-se o mânfio tendo como pano de fundo um emoldurado Churchill, o último maratonista da libra de ouro. Divertido, não? – porém a pouca vergonha desaba em desvergonha completa quando o Durão se enfia pela citação de personagens que justifiquem “a ruptura (destes pândegos) a favor dos direitos de cidadania” – que puta de aldrabice! – citando: “o acto de ruptura exige, normalmente, um porto de abrigo. (é mesmo em Belém) João Carlos Espada encontrou-o no pensamento liberal clássico, onde chegou através de três dos maiores autores do século XX, Popper; Schumpeter e Aron. Mas este tipo de remédios estragados têm explicação honesta:
As revoluções científicas de Thomas S. Kuhn
A teoria central de Kuhn é que o conhecimento científico não cresce de modo cumulativo e contínuo. E assim se passa também, no caso em apreço, com as práticas políticas dominantes adquiridas e instaladas. Ao contrário, esse crescimento é descontínuo, opera por saltos qualitativos, que não se podem justificar em função de critérios de validação do conhecimento científico. A sua justificação reside em factores externos, que nada têm a ver com a racionalidade científica e que, contaminam a própria prática científica. A importância atribuída por Kuhn, aos factores psicológicos e sociológicos na organização do trabalho científico, constitui um rude golpe na "imagem da ciência que se foi consolidando desde o século XVIII e que tende a identificar a cientificidade com a racionalidade - senão com a racionalidade «no seu todo», pelo menos com a racionalidade «no seu melhor»." A obra de Kuhn desencadeou um autêntico terramoto na filosofia da ciência e inaugura um discurso inovador, que privilegia os aspectos históricos e sociológicos na análise da prática científica, desvalorizando os aspectos lógico-metodológicos que ainda encontramos no discurso epistemológico popperiano.
Os saltos qualitativos preconizados por Kuhn, ocorrem nos períodos de desenvolvimento científico, em que são questionados e postos em causa os princípios, as teorias, os conceitos básicos e as metodologias, que até então orientavam toda a investigação e toda a prática científica. O conjunto de todos esses princípios constituem o que Kuhn chama «paradigma». Procurando ser fiel ao autor, utilizamos o conceito de paradigma em dois sentidos fundamentais. Num sentido lato, o paradigma kuhniano refere-se naquilo que é partilhado por uma comunidade científica, será uma forma de fazer ciência, uma matriz disciplinar. Uma comunidade científica caracteriza-se pela prática de uma especialidade científica, por uma formação teórica comum, pela circulação abundante de informação no interior do grupo e pela unanimidade de juízo em assuntos profissionais. Em sentido particular, o paradigma é um exemplar; é um conjunto de soluções de problemas concretos, uma realização científica concreta que fornece os instrumentos conceptuais e instrumentais para a solução de problemas. O paradigma é, neste sentido, uma «concepção de mundo» que, pressupondo um «modo de ver» e de «praticar», engloba um conjunto de teorias, instrumentos, conceitos e métodos de investigação; noutro caso, o conceito é utilizado para significar um conjunto de «realizações científicas concretas» capazes de fornecer "modelos dos quais brotam as tradições coerentes e específicas da pesquisa científica"."Assim, a descrição de Newton do movimento dos planetas (Lei da Gravitação Universal), ou a descrição de Franklin da garrafa de Leyden são, respectivamente, exemplos de paradigmas para a prática da mecânica e para a ciência da electricidade. Kuhn também designa estes «modelos concretos» como «modelos exemplares».
O desenvolvimento da ciência madura (ou da politica) processa-se assim em duas fases, a fase da ciência normal e a fase da ciência revolucionária. A ciência normal é a ciência dos períodos em que o paradigma é unanimamente aceite, sem qualquer tipo de contestação, no seio da comunidade científica. O paradigma indica à comunidade o que é interessante investigar, como levar a cabo essa investigação, impondo como que um sentido ao trabalho realizado pelos investigadores e limitando os aspectos considerados relevantes da investigação científica. O grupo limita-se a resolver um conjunto de incongruências que o paradigma lhe vai fornecendo, toda a investigação é realizada dentro e à luz do paradigma aceite pela comunidade. Nesta fase da ciência normal, o cientista não procura questionar ou investigar aspectos que extravasam o próprio paradigma, devemos dizer que a curiosidade não é propriamente uma característica do cientista, este limita-se a resolver dificuldades de menor importância que vão permitindo mantê-lo em actividade e que possibilitam simultaneamente revelar a sua engenhosidade e a sua capacidade na resolução dos enigmas. "Os problemas científicos transformam-se em puzzles, enigmas com um número limitado de peças que o cientista - qual jogador de xadrez - vai pacientemente movendo até encontrar a solução final. Aliás, a solução final, tal como no enigma, é conhecida antecipadamente, apenas se desconhecendo os pormenores do seu conteúdo e do processo para a atingir".Deste modo, o paradigma que o cientista adquiriu durante a sua formação profissional fornece-lhe as regras do jogo, descreve-lhe as peças a utilizar e indica-lhe o caminho ou objectivo a atingir. É evidente que o cientista, nas suas primeiras tentativas, pode cometer falhas, o que é perfeitamente natural, no entanto, tal facto é sempre atribuído à sua impreparação ou inépcia. Isto significa, que as regras fornecidas pelo paradigma e o próprio paradigma, não podem ser postas em causa, já que o paradigma é o sentido de toda a investigação e o próprio enigma a investigar não existiria sem ele.
Esta crença exacerbada no paradigma, demonstra-nos que "o trabalho do cientista (ou do politico) exprime uma adesão muito profunda ao paradigma". É evidente que uma adesão deste tipo não pode ser posta em causa ou ser abalada levianamente. A própria comunidade, na sua prática quotidiana, vai reforçando essa adesão a todo o momento. O que a experiência claramente demonstra, é que o cientista, individualmente ou em grupo, vai conseguindo resolver os enigmas, com maior ou menor dificuldade, à luz do paradigma vigente. Neste sentido, não devemos ficar admirados com a profunda resistência manifestada pela comunidade à mudança de paradigmas. O cientista, não está minimamente interessado em provocar um abalo, na estrutura do edifício que de certa forma o "alberga" e dá sentido ao seu trabalho profissional. O cientista é humano; a protecção, a confiança e de certo modo a segurança, são condições que todo o ser humano deseja alcançar. Todas estas condições, são fornecidas ao cientista pelo paradigma. "O que eles defendem nessa resistência é afinal o seu modo de vida profissional"
ler o resto:
"Ao cientista, (ou politico) «normal» pode suceder que o problema de que se ocupa, não só não tem solução no âmbito das regras em vigor, como tal facto não pode ser imputado à impreparação ou inépcia do investigador"
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