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Mark Twain
A ideia da Europa é obra de emigrantes, de povos oriundos das mais diversas procedências que por aqui foram construindo secularmente a realidade daquilo que tem sido até agora a ideia de “Estado Social” – foi este desígnio, assente sobre a exploração mercantil, primeiro com os “descobrimentos”, de seguida com a colonização, depois com o neocolonialismo imperialista que foi sendo exportado para todo o mundo. É na ressaca desta lúgubre epopeia que nos são agora devolvidos a casa os traumas da escravatura, do saque de recursos e da exploração desenfreada de milhões de criaturas que tentam desesperadamente escapar-se da condição de sub-humanos. Uma pequena minoria, sem dúvida dos mais capazes, ficam, conseguem prometer aos seus filhos uma vida melhor. É esta multiplicidade cultural e as várias tensões acumuladas que nos são mostradas “entre-os-muros” de uma sala de aula francesa – do folheto: “a experiência diária do ensino entre professores e alunos que interpretam os seus próprios papéis numa crónica ambígua sobre a Europa contemporânea” - um professor, cheio de boas intenções trabalha zelosamente para envolver os seus pupilos adolescentes, de ambos os sexos e de variadas raças e religiões no uso da linguagem e da literatura, mas vê os seus objectivos serem transpostos pelo cruzamento de linhas tabu.
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a Escola, "(...) nesta instituição naufragaram, entretanto, num conspurcado lamaçal, os nobres ideais instrutivos e formativos. O prodigioso computador portátil “Magalhães”, ofertado em grande escala, numa operação de marketing à americana, a alunos do 1.º ciclo que cada vez sabem menos de Português ou Matemática e utilizam os computadores somente para simples divertimento, é, de resto, o mais recente exemplo do sentido irreal e burlesco das prioridades deste sistema educativo.
A nova escola pública é hoje uma empresa gerida por muitos tecnocratas alinhados com a actual ordem política, e equipada por operários que se desejam amanuenses servis e catequizados na alegada única ideologia vigente (a qual - agora já todos o sabemos - se encontra manifestamente em crise de final de ciclo). A verdadeira função desta espécie de mal engendrada e desalmada linha de montagem é produzir, automaticamente, em massa, de forma acelerada, e a baixos custos, duvidosos produtos estandardizados. Esta nova escola é, afinal, um hino ao velho fordismo. O tal sistema aplicado por Henry Ford em 1908 que venerou o dinheiro como deus supremo do Homo sapiens sapiens e que projectou um mundo sublime, onde o Homem é castrado da sua capacidade cognitiva e coagido a demitir-se das suas quotidianas obrigações familiares bem como de outros cívicos desígnios sociais em nome do lucro desenfreado (de uns poucos), da sobrevivência, do consumismo e do hedonismo desregrados. Aquele sistema perfeito superiormente ironizado por Aldous Huxley (em o "Admirável Mundo Novo") ou por Charlie Chaplin (Tempos Modernos), nos anos 30 do século XX, que está agora no epicentro de mais um superlativo “tsunami” económico e financeiro de consequências imprevisíveis para a humanidade; “tsunami” esse cujas causas são reincidentes e estão bem diagnosticadas. Enfim, aquele implacável sistema materialista mecanicista e “darwinista”, que hoje transcende o sector secundário para atingir muitos serviços do sector terciário, e cujo modo de vida o escritor americano de ascendência portuguesa John dos Passos também satirizou, numa obra datada dos mesmos anos 30 ("O Grande Capital"), com estas antológicas palavras: “quinze minutos para almoçar, três para ir à casa de banho; por toda a parte a aceleração taylorizada: baixar, ajustar o berbequim, acertar a porca, apertar o parafuso. Baixar-ajustar o berbequim-acertar a porca-apertar o parafuso. Baixarajustaroberbequimacertaraporcaapertaroparafuso, até que a última parcela de vida tenha sido aspirada pela produção e que os operários voltem à noite a casa, trémulos, lívidos e completamente extenuados”.
“Porreiro pá!” Mas, pá, será esta a escola e o mundo que nós desejamos para os nossos alunos, para os nossos filhos?"
in "A Escola Pública e o Fordismo", por Luís Filipe Torgal
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