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sábado, outubro 10, 2009

Que coisa se esconde dentro da guerra no Afeganistão?

A extracção de urânio? O oleaduto trans-afegão? A posição geo-estratégica? Ou talvez o controlo do tráfico de drogas? Porquê faz exactamente oito anos, os Estados Unidos e os seus Aliados invadiram e ocuparam o Afeganistão? Que interesses se ocultam por detrás das explicações oficiais desta guerra? As hipóteses formuladas em todos estes anos são muitas, porém nenhuma suficientemente convincente. À excepção de uma, ainda que muito difícil de provar.

Os recursos energéticos. Num relatório publicado em Dezembro de 2000 no sitio web da EIA- Energy Information Administration, o organismo de estatística do Departamento de Energía de Estados Unidos (que foi retirado de imediato), o Afeganistão é apresentado como um país com escassos recursos energéticos (nunca explorados) que, segundo dados que remontam ao período da ocupação soviética, consistem em reservas de petróleo de 95 milhões de barris (concentradas na zona de Herat), depósitos de gás natural de 5 biliões de pés cúbicos (em Shebergan), mais 400 milhões de toneladas de carvão (entre Badakshan e Herat). São recursos demasiado pequenos para justificar uma invasão militar cujo custo até à data, só para os Estados Unidos, é de quase 230 mil milhões de dólares.
Muitos no Afeganistão falam de jazidas de urânio no deserto da província meridional de Helmand, região onde o controlo e a exploração estariam no centro de uma dura disputa entre forças norte-americanas e britânicas. Porém por agora esta história não teve nenhuma confirmação.

O oleaduto trans-afegão. Muitos afirmam que é a verdadeira motivação que levou os Estados Unidos a invadir o Afeganistão em 2001. O projecto de construir uma conduta de 1.680 quilómetros de comprimento para transportar gás de Dauletabad no Turquemenistão até ao Paquistão através do Afeganistão ocidental (Herat e Kandahar) foi iniciado em 1996 pela companhia petrolífera norte americana Unocal (para a qual trabalharam tanto Hamid Karzai como Zalmay Khalizad) em cooperação com o regime taliban (em 1996 a Unocal abriu escritórios em Kandahar e no ano seguinte membros do governo taliban foram recebidos nos EUA). A ideia foi abandonada em finais dos anos 90 à espera que “a situação politica e militar no Afeganistão melhore” (fonte: EIA, Dezembro de 2000). Dada a impossibilidade de abrir o corredor sul da Ásia, o Ocidente optou pelo Cáucaso meridional, e em 2006 inaugurou um gasoduto que transporta gás do Turquemenistão para a Turquia através do Mar Cáspio, Azerbeijão e Geórgia ( e que a partir de 2015 se ligará com o gasoduto Nabuco).
O projecto do gasoduto afegão, sem dúvida, não é abandonado. Os três países envolvidos voltam a estudá-lo a partir de 2002, e em Abril de 2008 firmam um acordo com a Índia que prevê a abertura do oleaduto em 2018 (previsão excessivamente optimista, segundo os analistas do sector). Para financiar o projecto (7.600 milhões de dólares) conta-se com o Banco Asiático de Desenvolvimento (de que os Estados Unidos e o Japão são os principais accionistas). As empresas petrolíferas interessadas são estado-unidenses, britânicas e canadianas. Embora importante, parece arriscado identificar este projecto – de muito difícil realização e superado por outras rotas – o motivo da ocupação continuada do Afeganistão pelas tropas ocidentais.

O interesse estratégico. O Afeganistão tem a desgraça de estar no coração do continente asiático, numa posição estratégica que permite a quem controle o país monotorizar de perto todas as potências nucleares da região: China, Rússia, Índia e Paquistão; e completar o cerco ao Irão, país que em caso de guerra com os Estados Unidos se enfrentaria com um ataque em duas frentes: Iraque e Afeganistão.
Sem dúvida, segundo muitos analistas militares, a vontade norte americana de controlar o Afeganistão deve ser lida, sobretudo, como chave de contraposição à China, considerada pelo Pentágono como a maior ameaça potencial à hegemonia militar e económica mundial para os EUA, não apenas na Ásia mas também no Médio Oriente, em África e na América Latina. Uma ameaça que se tornou mais real depois da criação, em Junho de 2001, da Organização de Cooperação de Shangai (OCS), que reúne a China, Rússia, as Repúblicas da Ásia Central, e brevemente, talvez incluindo o Irão. E que no futuro, dada a sua integração gradual com a Organização do Tratado de Segurança Colectiva (OTSC), a aliança politico- militar liderada pela Rússia, poderia estender a sua influência até à Europa Oriental (Bielorússia) e ao Cáucaso (Arménia), convertendo-se, para todos os efeitos, numa aliança contraposta a uma NATO liderada pelos EUA. Um Afeganistão debaixo do controlo americano é uma faca apontada nas costas da China, em particular pela sua aproximação de Xinjiang, uma região ríquissima em petróleo e desestabilizada pelo nacionalismo Uigur (com sustentação tradicional da CIA). A importância geoestratégica do Afeganistão é inegável e tem desempenhado certamente um papel importante na decisão dos EUA de ocupar o país e estabelecer aí bases militares permanentes.

O negócio das drogas. Porém talvez por trás da guerra no Afeganistão se escondam interesses ainda maiores e mais inconfessáveis: os relacionados com o controlo do tráfico mundial de heroína, um dos negócios mais rentáveis do planeta, com um volume de negócios anual estimado em redor de 150 mil milhões de dólares por ano.
Não é nenhum segredo que o auge da produção de ópio e heroína nos anos 70, no chamado Triângulo Dourado (Laos, Birmânia e Camboja) foi dirigido pela CIA (1), que com o produto das operações de tráfico de droga financiava as suas operações anti-comunistas no Sudoeste Asiático (2). O mesmo sistema – igualmente bem conhecido – foi adoptado pela CIA nos anos 80 na América Latina, para financiar com o produto da cocaína, a guerrilha anti-sandinista dos Contra na Nicarágua (3), e no Afeganistão, com as receitas obtidas com a heroína, a resistência anti-soviética dos Mujahedins (4)
No Afeganistão o negócio continuou também nos anos 90 e incrementou-se com a chegada ao poder dos Talibans, com o conhecido apoio da CIA. Até ao ano 2000, quando o mulah Omar, a fim de obter apoio internacional para o seu regime, decidiu proibir a produção de ópio, que em 2001 caiu para níveis próximos de zero!!
Uma produção que no Afeganistão “libertado e controlado pelos militares e serviços secretos dos EUA se reaviva a ritmo intenso desde 2002 (quando os talibans ainda não haviam regressado) pulverizando todos os recordes históricos e transformando em poucos anos este país da Ásia meridional no principal produtor de heroína do mundo (93 por cento da produção mundial). Uma situação que as forças armadas dos EUA presentes no Afeganistão se têm negado sistematicamente a enfrentar, afirmando que este “não é o seu trabalho” e deixando-o em mãos do governo marioneta de Kabul. Segundo um número cada vez maior e mais heterogénio de especialistas e pessoas bem informadas, a CIA haveria sub-contratado a produção e preocessamento da heroína ao narco-Estado encabeçado por Karzai, protegendo pela sua parte as rotas de evacuação por via terrestre (Paquistão, Irão e Tajiquistão) e gerindo directamente os despachos por via aérea para o exterior.

¿Uma nova Air América? (5). Segundo uma investigação realizada pelo canal de televisão russo Vesti, a heroína afegã sai do Afeganistão a bordo de aviões de transporte militar dos Estados Unidos directamente desde as bases de Ganci no Kirguistão, e de Inchirlik na Turquia. E segundo escreveu no The Gardian o jornalista afegão Nushin Arbabzadah, amiúde escondida em caixões de militares norte americanos, cheios de droga em vez de cadáveres. “Creio que é possível que isto suceda, embora não o possa provar”, comentou diplomaticamente o embaixador russo em Kabul, Zamir Kabulov.
O jornalista russo Arkadi Gubnov, do jornal Vremya Novostei, fez pública uma informação proporcionada por uma fonte dos serviços secretos afegãos, e escreveu: “cerca de 85 por cento de toda a droga produzida no Afeganistão é transportada para o exterior pela aviação norte americana”. No Verão passado, o general russo Mahmut Gareev, ex-comandante das tropas soviéticas no Afeganistão, declarou ao canal Rússia Today; “Os estado-unidenses não fazem nada contra a produção de droga no Afeganistão porque ela lhes proporciona, pelo menos, 50 mil milhões de dólares por ano. Não é mistério nenhum que os estado-unidenses transportam a droga nas suas aeronaves militares para o estrangeiro”. O jornalista norte americano Dave Gibson, do NewsMax, citou uma fonte anónima dos serviços de informações dos EUA afirmando que “a CIA sempre esteve envolvida no tráfico mundial de drogas, e no Afeganistão simplesmente levam a cabo o seu negócio favorito, como fizeram durante a guerra do Vietname”
O economista russo Mikhail Khazin disse numa entrevista que “os estado-unidenses estão a trabalhar no duro para manter o tráfico de estupefacientes no Afeganistão através das garantias de segurança qua a CIA dá aos traficantes de drogas locais” “Os Estados Unidos não se opõem ao narcotráfico afegão para não pôr em causa a estabilidade de um governo apoiado pelos principais traficantes de droga no país, começando pelo irmão de Karzai” escreve o famoso jornalista norte americano Eric Margolis no Huffington Post. “
“O que sucedeu no passado na Indochina e na América Central indica que a CIA poderia estar implicada no tráfico de drogas afegãs numa medida maior do que a que já sabemos (6) Em ambos os casos, os aviões da CIA transportavam drogas para o estrangeiro em nome dos seus aliados locais, e o mesmo pode estar a ocorrer no Afeganistão. Quando a história desta guerra estiver escrita (7), a sórdida participação de Washington no tráfico de droga afegã será um dos capítulos mais vergonhosos.

¿Narco-dólares para salvar os bancos em crise?. Antonio Maria Costa, director geral dos escritórios das Nações Unidas contra a Droga e o Delito (ONUDD), numa entrevista ao semanário austríaco Profil declarou: “O narcotráfico é a única indústria em crescimento. Os lucros são reinvestidos só parcialmente em actividades ilegais, o resto do dinheiro é colocado na economia legal mediante operações de branqueamento. Não sabemos quanto, porém o volume é impressionante. Isto significa a entrada de capital de investimento. Há indícios de que estes Fundos também acabaram no sector financeiro, que está debaixo de evidente pressão desde a segunda metade do ano passado (devido à crise financeira mundial). O dinheiro do tráfico de drogas é actualmente o único capital liquido disponível para investimento. Na segunda metade de 2008, a liquidez era o principal problema do sistema bancário, daí que este capital efectivo se tenha convertido num factor importante. Parece que os empréstimos bancários têm sido financiados com dinheiro que provém do narcotráfico e de outras actividades ilegais. É, obviamente, difícil de provar, porém há indícios de que alguns bancos se salvaram por estes meios

notas:

(1) ver a história do Triângulo Dourado na Wikipedia
(2) George Herbert Walker Bush foi director da CIA entre 1976-77; vice-presidente de Ronald Reagan entre 1981 e 1989; e por fim o 41º presidente dos EUA (1989-1993)
O último acto de Bush durante seu mandato foi decretar o perdão dado a seis ex-altos funcionários do governo implicados no processo Irão-Contras nos últimos dias do seu mandato, em 24 de dezembro de 1992, ilibando entre eles o ex-Secretário da Defesa Caspar Weinberger e o ex-embaixador dos EUA nas Honduras e depois embaixador dos EUA no Iraque , John Negroponte.
(3) Air America: linha aérea norte americana estabelecida em 1946, propriedade da Agência Central de Informações (CIA) e gerida pela sua Divisão de Operações Especiais, responsável pelas actividades secretas da Companhia, desde 1950 até 1976. Para mais informações sobre a participação da CIA e da Air América no tráfico, leia-se Alfred W. McCoy: “The Politics of Heroin in Southeast Asia, 1972.
(4) ver Herbert Bush e a União soviética na Wikipedia
(5)Durante a guerra do Vietname a CIA foi atingida por uma série de revelações, incluindo as baseadas nas investigações da Comissão Frank Church sobre actividades ilegais não autorizadas da Agência. O problema foi “resolvido com” a colocação de George Herbert Bush como director-geral da CIA nos anos 1976/77.

(6) Seguir a partir de O Fim Da Democracia a coincidência de Herbert Bush na direcção da CIA em 1976, a subida à presidência portuguesa do general Ramalho Eanes nesse mesmo ano, a assassinato do ministro da Defesa Amaro da Costa numa acção relacionada com tráfico de drogas que envolviam as forças armadas, num processo nunca investigado; e a ascenção de Cavaco Silva na década de 90, quando se tornou amigo pessoal de George Herbert Bush depois da sua colocação na presidência dos EUA.
(7) A biografia oficial do pai do 43º presidente, George W. Bush (2000-2008), foi muito convenientemente apagada das ligações à CIA. Aconselha-se vivamente a leitura da biografia não oficial elaborada por William Tarpley onde se explicam as ligações da família Bush com os sectores mais sórdidos da extrema direita europeia desde o fim da II Grande Guerra.

(Fonte original do post: "Enrico Piovesana – Peace Repórter – “Cosa si nasconde dietro la guerra in Afghanistan?”)
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