Um Diálogo com Noam Chomsky
D. Macedo – Há alguns anos, fiquei intrigado com um episódio ocorrido na Bóston Latin School. David Spritzler, um aluno de doze anos, sofreu um processo disciplinar por se ter recusado a recitar o Juramento de Fidelidade (Pledge of Allegiance), juramento que ele considerava “uma exortação hipócrita do patriotismo” uma vez que não existe “liberdade e justiça para todos”. O que lhe quero perguntar é por que é que um rapaz de doze anos consegue perceber a hipocrisia do juramento de fidelidade, e o seu professor e os administradores da escola não? Eu acho desconcertante que professores, que pela própria natureza da sua função se deveriam considerar intelectuais, não sejam capazes ou se recusem conscientemente a ver o que é tão óbvio para alguém tão jovem.
Noam Chomsky – Isso não é assim tão difícil de compreender. O que você acabou de descrever é um sinal do grau de enraizamento da doutrinação nas nossas escolas, que leva a que uma pessoa instruída não seja capaz de entender idéias elementares capazes de serem compreendidas por qualquer criança de doze anos.
D. Macedo: Eu acho desconcertante que um professor altamente instruído e um director de uma escola estejam dispostos a sacrificar o conteúdo do Juramento de Fidelidade para imporem obediência, ao exigirem que um aluno recite o Juramento de Fidelidade.
Noam Chomsky – Eu não considero isso nada desconcertante. Na realidade, o que aconteceu com David Spritzler é o que se espera das escolas, que são instituições dedicadas à doutrinação e à imposição de obediência. Longe de criarem pensadores independentes, ao longo da história as escolas sempre tiveram um papel institucional num sistema de controle e coerção. E, uma vez convenientemente educado, o indivíduo foi socializado de um modo que dá suporte à estrutura de poder que, por seu lado, o recompensa generosamente. Vejamos o exemplo de Harvard. Aí os estudantes não se limitam a aprender matemática. Aprendem também o que é esperado de um graduado de Harvard no que diz respeito ao seu comportamento e ao tipo de perguntas que nunca se devem fazer. Aprendem as subtilezas das recepções, as formas de se vestir mais adequadas e como falar com sotaque de Harvard.
D. Macedo – Como é possível que esses intelectuais, assim formados, que operam num enquadramento propagandístico consigam escapar incólumes com a sua cumplicidade para com as falsidades que disseminam ao serviço de poderosos interesses?
Noam Chomsky – Eles não se escapam com nada. Na realidade, estão apenas a prestar um serviço que as instituições para as quais trabalham esperam deles. E eles, voluntariamente,talvez inconscientemente, preenchem os requisitos do sistema industrial. É como se contratasse um carpinteiro e, depois de ele concluir o trabalho para que foi contratado, lhe perguntasse como é que ele se tinha safado com aquilo. Ele fez o que dele era esperado. Bem, os intelectuais prestam um serviço semelhante. Fazem o que deles é esperado ao oferecerem uma descrição razoavelmente exacta da realidade que se adequa aos interesses das pessoas que detêm a riqueza e o poder – os donos das instituições a que chamamos escolas e, de facto, da sociedade de um modo geral. (entrevista completa, aqui)
a Invasão
"O português está a ser esfacelado pela bacoca anglicização do vocabulário e maneiras de dizer e pela preocupação tecnológica com uma linguagem própria sem base cultural"
"Que uma escola estrangeira estabelecida entre nós ofereça os cursos na respectiva língua, compreende-se e é um enriquecimento; que seja uma escola portuguesa a mascavar os seus cursos em inglês, por mais shakesperiano que seja, é intolerável; e chega-se à humilhação de serem os estudantes estrangeiros a requererem que os cursos sejam dados em português - como é de toda a lógica"
"A introdução de estrangeirismos justifica-se sempre que se trate de ideias ou realizações novas e não disponhamos de equivalente na nossa lingua. Mas tem-se generalizado a adopção de aportuguesamentos de léxico estrangeiro quando dispomos de equivalente a dispensá-los, e num e noutro caso construimos formas atrabiliàriamente, acabando por forjar vocábulos que ofendem o bom senso e o bom gosto"
Vitorino Magalhães Godinho, no Jornal de Letras
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