Quando Pedro Mexia, o nóvel herdeiro do catolicismo de barba rala na Cinemateca, fez recentemente a recensão de “Os Homens do Terror”, um breve ensaio publicado na “Der Spiegel” em 2005, da autoria do islamofóbico Hans Magnus Enzensberger (1), intitulando-a de “os vanguardistas da morte” começou do seguinte modo: “o autor sustenta que o terrorismo islâmico (ou de Bush?) nasce da decadência intelectual dos paises árabes, que vêem o progresso do Ocidente como uma afronta intolerável” (a contra-corrente, numa época em que a maioria vê na civilização ocidental (2) francos sinais de decadência), prosseguindo:
“Num filme de Nanni Moretti, um amigo pergunta-lhe: “Sabes o que diz Magnus Enzensberger?” Moretti nem tem tempo para responder, porque o amigo declara: “Estou de acordo com ele”. De facto, o ensaista e poeta alemão corresponde ao modelo antigo de escritor que exprime ideias sobre os acontecimentos do seu tempo que influencia as ideias dos outros. O tema é óbvio mas ambicioso: a violência tecnológica de massas, com a qual vivemos. “Os Homens do Terror – Ensaio Sobre o Perdedor Radical” tenta compreender o clima cultural em que vivemos desde o ataque em 11 de Setembro”
O crítico prossegue por mais duas colunas dissecando a gasta cartilha neocon “os anónimos suicidas matam indiscriminadamente sem que a corja faça exigências concretas”; mas Pedro Mexia não mais volta a mencionar o nome de Nanni Moretti que lhe serviu de pretexto para vender uma certa ideia de esquerda – e incorporá-la na prosa conservadora para que desapareça de cena, eis a táctica dos actuais ideólogos do sistema.
O Regresso do Caimão
Na anterior campanha eleitoral em Itália, Moretti realizou “o Caimão” como aviso para os perigos da eleição de Berlusconi. Os italianos entenderam a corrupção na forma de farronca desbragada e elegeram um coligação impossivel. Mais do mesmo, a esposa de um pequeno partido que apoiou o governo de Prodi envolve-se num esquema de corrupção com a máfia do lixo, o marido demite-se e a coligação cai. Na verdade existirá alternativa numa Europa onde o recém empossado governo de Zapatero presta fidelidade à Constituição jurando com a mão assente sobre a Bíblia de olhos postos numa Cruz e no alto representante da Oligarquia?
Em Itália autopromove-se uma figura da famiglia Veltroni, cujo apelido se passeou pela autarquia de Roma com umas incursões literárias no romance popular (3) e pela administração dos telejornais da RAI. Diz-se dele: “muito bom a apresentar-se, a vender-se; é o candidato mais berlusconizado”. Na verdade estamos em condições de indicar o vencedor, antes do fecho das urnas, mesmo ainda que se não votasse – venceu Veltrusconi. Como na historieta do Mexia, a oposição incorpora-se no lamaçal mediático único e desaparece do mapa.
“Il Vitelloni”, os Inúteis (4)
Nem aqui, nem lá, seja onde for, quase não os vejo nem os ouço. Há uns fugazes contactos no rádio do carro, Cecília Bartoli: “Berlusconi e Veltroni dizem ambos o mesmo, são as faces visiveis das duas tribos que monopolizaram com leis feitas por medida os assentos em “la Porcata” (o parlamento). Um fogacho na televisão no lapso da bica: o Jardim da Madeira chafurda no mesmo tema mas por outras cascas de abóbora. Nada é o que aparenta, a realidade tem mil representações, as imagens que podemos reflectir são pézinhos de coentrada fast-food, fragmentos de outras anatomias ou, como nas telas de Julião Sarmento, tudo o que se disser, metade Coelho metade Vara, são apenas reflexos das manchas de sujidade do ambiente.
(1) Mexia descarta a formação inicial marxista do autor, passa por cima da famosa declaração de 1979: "the Germany Federal Republic after all is a protectorate of the United States even if it is not considered good taste to discuss this subject publicly"; Foi a primeira vez que um alemão reconheceu que os Judeus tinham ganho a guerra!. Mas Mexia pega na única parte dissidente que lhe interessa: a "guerra ao terrorismo", ou seja, a adesão ao bushismo.
(2) Citando de "Europa, Europa": "in Portugal, he contemplates the stolid natives passive sabotage that undermines capitalist efficiency", portanto a coisa já dura há 30 anos.
(3) “Senza Patricio” é um romance sobre “Papás que amam os Filhos”. Walter Veltroni e Vittório Veltroni são ambos produtos hibrídos da mitologia cultural do evaporado “euro-comunismo” trade mark registered berlinguer-kennedyana.
(4) “Il Vitelloni” é um filme de Federico Fellini. Por ironia passa hoje na Cinemateca. A memorável despedida de um grupo de garotos que só no final da festa percebem que são personagens que estão completamente perdidas.
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